Em Julho de 1956 eu estava, como sempre, em
Lisboa. À tristeza de saber que não voltaria mais a Tomar, contrapunha-se o
prazer de nesse ano ter cá o meu irmão. Pela mão dele conheci a Lisboa dos
Monumentos, dos Miradouros, dos Bairros Populares, dos jardins.
Uma manhã fomos à Basílica da Estrela.
Passámos pelo bonito jardim, atravessámos, e no adro da Igreja estava um grupo
de miúdos de alpergatas ( nesse tempo não havia ténis Nike), calças americanas
(também não havia jeans Levis), um rádio de pilhas de onde saía o barulho de
uma música estranha e um senhor aos gritos. Os rapazinhos torciam-se,
atiravam-se ao chão, davam gritos, como se estivessem a ter algum ataque
estranho. A provinciana pata brava, que vivia em mim, ficou pasmada com aquilo.
Logo o mano mais velho e citadino, se apressou a explicar que era um estilo de
música e dança vindas da América. Fiquei mais calma e elucidada, embora um
pouco espantada. É que em Tomar tirando os fados, a música popular, os tangos e
as valsas, aquela música ainda não era conhecida.
Entrámos na Basílica e fiquei deslumbrada. Já
por fora a achara linda, equilibrada, com uma torre de cada lado e aquela
cúpula enorme lá em cima. Dentro rendi-me à beleza dela. Foi-me explicado que
D. Maria I, a mandara erigir como promessa pelo nascimento de um filho. Os
arquitectos e pintores, alguns tinham trabalhado em Mafra. A harmonia e
delicadeza das colunas é maravilhosa. A primeira pedra foi lançada em 1776 e a
Basílica foi inaugurada em 1789. É de estilo Neoclássico, com três naves. Na do
centro destaca-se o túmulo da sua Fundadora. Morta no Brasil, foi o seu corpo
trazido para Portugal e ali repousa.
A parte mais aventurosa da visita foi a
subida ao Zimbório, que pouco depois foi encerrado ao público. Subimos a escada
e no alto eu tive Lisboa aos pés. E Lisboa é tão linda! Os telhados, as
trapeiras com sardinheiras, as torres de outras Igrejas, o verde dos jardins,
tudo me parecia novo e diferente. O céu azul estava tão perto, que por
instantes, julguei lá chegar. O Tejo brilhava ao fundo, sulcado de Cacilheiros
e outros barcos, os sons chegavam lá acima esbatidos. Com os olhos cheios de
luz, desta luz de Lisboa que não é igual a mais nenhuma, desci com pena.
Foi assim, meu irmão, pela tua mão, pela tua
voz, com o teu carinho, que passei amar Lisboa de outra maneira mais profunda,
mais íntima.
Até um dia destes.
Maria