sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Carta Anónima

Tudo tem uma primeira vez. Nunca escrevi uma carta anónima e, confesso, repugnam-me as ditas.
Esta tem que ser assim por várias razões: Não quero magoar ninguém, nem ser mal entendida.
Não é uma carta de amor nem ódio, não é saudade, é lembrança.
Quando tinha desasseis anos, conheci alguém por quem me apaixonei ou julguei apaixonar-me. Era um rapaz bonito, tipo galã de cinema, com dezanove anos. Ao princípio fiquei deslumbrada. Ir pela rua com ele dava-me orgulho, sentia a inveja das outras mocinhas e, gostava. As conversas dele eram um pouco ocas mas, vestia bem e, como já disse, era bonito. Um dia, no intervalo de um filme de Cantinflas, ouvi-o a falar com a moça que nos acompanhava e, fiquei perplexa. Não falavam do filme nem de nada de interesse. Simplesmente, discutiam o número de camisolas, calças, camisas, casacos, sobretudos, sapatos... só faltou enumerarem as cuecas e peúgas. Na minha cabeça fez-se um grande ponto de interrogação. Eu que tinha pouca roupa e ligava pouco a essas coisas, ali, feita parva, a olhar os cartazes do cinema e, pensando com os meus botões: “Serei capaz de viver uma vida com alguém assim?” As conversas em casa eram outras. Literatura, História, Política... Felizmente ou infelizmente, a campainha do cinema tocou.
Entretanto a minha Mãe adoeceu. Foram nove meses de medo, angústia, terror de a perder. Ele foi impecável. Sempre presente, sempre paciente para me ouvir e limpar as lágrimas. Isso lhe devo e agradeço.
Os anos passaram, os meus pais conheciam-no, o namoro era oficial. Às vezes pensava se era aquilo que eu queria, mas deixava andar por comodismo. Sabia que não queria ser apenas a “esposa” de um senhor. Queria ser mulher de um homem. Queria caminhar ao lado e não atrás desse homem.
Um dia recebi uma carta do dito cujo, dizendo gostar muito de mim mas, por motivos vários, ter-se casado com outra. Não senti grande desgosto. Despeito, sim. Acima de tudo uma sensação de liberdade enorme. Quando soube que os tais motivos se resumiam num carro de luxo e uma vivenda mobilada, a minha primeira reacção foi rir. “O tal grande amor” custara um carro e uma casa. Fiz as contas e achei que valia mais. Esqueci e esperei. Hoje, ao fim de cinquenta anos, lembrei-me desta história e, pensei que devia agradecer-lhe a oportunidade que me deu. Nem sei se é vivo ou morto. Não lerá isto de certeza. Mas agradeço da mesma maneira que lho diria cara a cara. Afinal, eu fiquei com a melhor parte. Encontrei um homem a sério, tive três filhos, dois netos, tenho a minha casa, um carro e, acima de tudo, sou feliz. E tu, anónimo? Foste feliz? Valeu a pena?
Tens muitas roupas de marca, muitos carros, chegaste onde querias? Espero sinceramente que sim. Nunca te quis mal. Melhor, raramente penso que exististe, que passaste um dia pela minha vida. E se alguma vez pensares em mim, não tenhas remorsos (sabes o que isso é?). Fizeste-me um grande favor. Por isso, de novo te agradeço.
Até nunca anónimo.
Até um dia destes, meus amigos.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Tomar Sempre


Neste primeiro dia do Ano é de ti, minha terra adorada, que me lembro com tristeza. Que o Novo Ano seja melhor para ti, que não haja mais tornados, cheias, gente sem casa, gente com fome. Que os Tabuleiros saiam à rua com todo o seu esplendor, que a Cerca volte a abrir renovada, que o Jardim volte a ser o mesmo em que em pequena brinquei.
Claro que tenho outros desejos. Saúde para os meus doentes, Paz para os mortos e vivos, entendimento neste mundo desavindo.
É só isto que desejo.
Para todos vós, meus amigos, que tudo vos corra como desejam.
Um grande abraço para todos.
Até um dia destes.
Maria