terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Até um dia destes

Vou encostar a porta de mansinho, parar por algum tempo.
Vou voltar, prometo, mas não sei quando.
Como se costuma dizer, não tenho dia, nem mês marcado. Pode ser daqui por quinze dias, um mês, não sei.
Razões de saúde, a isso me levam.
Continuarei a vir aos vossos blogs, farei comentários, lerei os mails.
Não quero perder-vos, daí esta curta explicação. A Maria continua aqui, mas está doente. Logo que esteja bem, volto. É uma promessa.
Por isso, abraços grandes e beijinhos para todos e...
Até um dia destes.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

O galo que não queria morrer


O nosso amigo Zé do Cão, levou-me tão longe com a história do peru, que não resisto a contar uma passada com um galo, que não queria morrer.
Foi há muitos anos. Eu teria 5, talvez. Morávamos ainda, na velha casa onde nasci. A cozinha era grande, com soalho de tábuas corridas e alguns ladrilhos junto da lareira. Um dia, deram ao meu pai um belo galo, crista vermelha, boas goelas. O bicho, metido num caixote, asas presas, olhava para nós com ar sobranceiro, como se interroga-se o que fazia ali, tão longe do seu galinheiro natal e das suas galinhas. De vez em quando, abria as goelas e lançava para o ar um grito de protesto.
A minha mãe, tal como eu, nunca foi capaz de matar um animal. A mocinha, que ajudava lá em casa, negava-se a cortar o pescoço ao galo, porque tinha medo dos olhos dele. A minha mãe pediu ao meu pai para antes de sair, tratar da saúde ao bicho. Ele disse que sim, mas esqueceu-se. A mãe, tinha o nariz arrebitado e era orgulhosa, não pediu segunda vez. Mandou a moça pôr o panelão de água ao lume, para dar o banho póstumo ao galo, muniu-se do maior facão que tinha, pôs o dito dentro de um alguidar de barro e, vá de cortar o pescoço. Aí começou a tragédia. Só cortou metade. O desgraçado, cabeça pendurada, sangue a espirrar por todo o lado, esvoaçou pela cozinha, deixando sangue e dejectos por onde passava. Em desespero, a mãe mandou a moça chamar o meu pai ao emprego, ali ao virar da esquina. Entretanto havia loiça partida, a cozinha metia nojo e, ele continuava no seu esvoaçar de adeus sem se deixar agarrar. Por fim, o pai chegou, agarrou o galo e, de um golpe, cortou o pescoço todo.
Galo morto, metido no alguidar e escaldado, o resto do dia foi passado a reparar os estragos. Os móveis e o chão de madeira, foram esfregados, vezes sem conta, com sabão amarelo, potassa, muitas águas e uma escova de barbas rijas. Levou tempo até tudo ficar em ordem.
O galo era velho. Não havia panelas de pressão. Quando à noite o fomos comer, estava rijo como pedras. Foi a vingança dele, acho.
Vês Zé, o que as tuas histórias fizeram?
De alguidares, falaremos noutro dia.
Até um dia destes.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Mariana


Não conheço, pessoalmente, a Mariana Palavra, mas conheço bem a família dela.
Vareira, jornalista, 31 anos. No Haiti durante o terrível sismo, a sua voz e imagem, aparecem em todos os noticiários.
As nossas famílias foram sempre íntimas. A tia é uma das minhas melhores amigas. Há dias, tínhamos falado da Mariana. Quando ouvi a notícia do sinistro, foi a primeira pessoa que me veio à ideia.
Apressei-me a telefonar à tia e, esta disse-me que ela estava viva e bem fisicamente. Deveria voltar breve.
Depois, vi a Mariana e ouvi-lhe a voz. Uma voz aparentemente calma. Falava dos amigos que perdeu, daqueles de que não sabia o paradeiro, do horror que presenciava.
Hoje, ao ler as notícias, vi que a Mariana vai ficar lá, onde precisam dela, diz.
Sabe-se lá porquê, não fiquei admirada. Talvez porque sei de que fibra é aquela família feita. Apreensiva, sim. A mãe, a tia, os irmãos, devem estar em pânico. Esperavam a volta dela, para a acarinhar e, fazer esquecer um pouco, o pavor que viveu e continua a viver. Mas devem estar muito orgulhosos também. Eu estou.
Mariana, não nos conhecemos, mas de agora em diante, entraste na minha galeria de heróis e heroínas.
Talvez um dia, os nossos caminhos se cruzem. Gostava de te abraçar, de te dizer tudo o que em mim provocaste.
Obrigada Mariana Palavra. Tu és a prova de que afinal, a tua geração não é a “Geração Rasca”. Ainda há muita gente boa e muita mulher valente.
Até um dia destes.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Miúdos em dias de chuva


Hoje, falando com o meu filho mais velho, ele queixava-se que, o filho com onze anos se molhava de propósito. Isto transportou-me para muito tempo atrás, quando tinha a mesma idade e até mais anos.
Quando mudamos de casa em Tomar, fomos morar para um prédio acabadinho de fazer, na então parte Nova da Cidade. As ruas ainda não estavam feitas, eram barrentas, cheias de buracos, que com a chuva se tornavam poças de água. Da casa onde morava até à Escola que frequentava, era perto. Tinha, então, um belo impermeável vindo de Espanha, branco, com carapuço e quase até aos pés. Usava botas de carneira com tachas nas solas e, claro, um guarda-chuva, que eu usava para tudo, menos para me abrigar da dita chuva. Os pés, fosse porque razão fosse, entravam em todas as poças. Algumas eram fundas e, a água entrava pelo cano baixo das botas. O capuz, nunca cobria a cabeça. O gozo de sentir a água escorrer cara e tranças abaixo, era imenso. Chegava a casa feita pinto molhado. Claro que ouvia raspanete. Claro que apanhei algumas constipações. Mas o prazer de sentir a chuva na cabeça e na cara, patinhar em tudo quanto era buraco, faziam-me esquecer o resto. As tranças molhadas a bater-me no rosto, a sensação de liberdade de as ver dançar ao vento, como cordas molhadas, são lembranças que não esquecem. Agora, fujo da chuva e do vento e nem me atrevo a enfrentá-los. Mas aquele prazer está na minha memória marcado como uma lembrança muito boa.
Por isso entendo o meu puto. Que importa uma constipação, comparada com a liberdade de apanhar uma valente carga de água?
Afinal, as crianças não mudaram assim tanto. E eu, pelos vistos, continuo, por dentro, a ser a “trancinhas” maluca, garota, que tem uma pena danada de já não ter coragem de se meter debaixo de chuva, com os pés dentro de água e um guarda-chuva fechado na mão.
Até um dia destes.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Meu Neto




Há onze anos, à uma hora e um quarto, tive uma prenda das mais lindas que até hoje recebi.
Na noite gelada, depois de umas horas de ansiedade por ti e pela tua mãe, nasceste. Já era a quinta vez, que tinha uma prenda dessas, um bebé. O primeiro, o teu pai, depois a ti-ti e o padrinho, de seguida a minha primeira neta, naquele momento, tu.
Um menino lindo, perfeito, um misto de boneco e anjo.
Passados três meses, novo presente. Os teus pais emprestaram-te à avó. Foram dois anos muito felizes. Voltar a ter um bebé nos braços, acalenta-lo com velhas canções de embalar, que ainda lembras, ver-te crescer, esperto, alegre, meigo, ouvir-te as primeiras palavras. Estas, fazem-me sempre rir. O Nabão, teu companheiro e guarda, ladrava e, eu dizia: “Cala-te cão”. Um dia, ele ladrou e, antes de eu dizer nada, ouvi a tua voz de bebé: “Caa cão”. Chorei e ri ao mesmo tempo.
A vida afastou-nos. Foste para mais longe e, o sonho acabou. Quando cá estás, ainda pedes ao deitar: “Canta a da Estrelinha, avó”. E, de novo baixinho, canto para ti, a “Canção de Embalar” do Zeca Afonso. Até quando vais pedi-la? Hoje fazes 11 anos. E é por isso, que tudo me vem à ideia. Porque me lembro, que foste e és, o último bebé que embalei com ternura e força de mãe. Agora, já não tenho força, mas ainda te posso cantar: “Dorme meu menino, a Estrela d’alva, já a procurei e não a vi, outra que vier de madrugada, outra que eu souber, será para ti.” Queria dar-te, a ti e à tua prima, todas as estrelas do céu e, um mundo onde fosse fácil viver.
Vou mandar-te a “Canção da Estrelinha”, não cantada por mim, mas pelo seu autor.
Beijinhos, coceguinhas na orelhinha, um dia muito feliz, meu neto.
A tua avó continua a adorar-te.
Agradeço aos teus pais, esses dois anos, que nunca esquecerei.
Bom Ano Novo para os três, é o que mais deseja a mãe e avó.
Maria