quinta-feira, 30 de abril de 2009

Maio, o mês das flores, diz-se


Era Tomar e ao abrir a janela, havia um cheiro a flores no ar.
Nas floreiras do meu quarto havia sardinheiras de todas as cores.
A minha mãe gostava delas, eu não. Nem do cheiro, nem delas.
Em frente havia jardins cheios de flores, que não aquelas. Rosas, amores perfeitos, cravinas, cravos e violetas, violetas roxas, pequeninas, perfumadas. Tentava não sentir o cheiro das sardinheiras e, sentir só os outros. Saía de casa e, na Estrada da Serra havia maias amarelas, com um cheiro adocicado, havia papoilas sem cheiro, mas daquele vermelho que aquece a alma, havia margaridas, malmequeres, erva. E o cheiro da terra quente e húmida do orvalho. Descia a rua até à ponte, o rio corria, os salgueiros faziam um ruído manso, abanando ao de leve. Os patos do Nabão preparavam o ninho, os barbos saltavam. Dos cafés saía o cheiro de meias-de-leite e torradas. Das padarias vinha o inconfundível cheiro a pão acabado de cozer. Os cheiros da minha infância, os cheiros da minha terra.
Vasco, vê se me trazes uma flor. Uma maia ou outra, tanto faz. Não compres. Apanha numa rua, num jardim. Rouba uma flor para mim, uma flor, que mesmo murcha, traga um pouco do cheirinho de Tomar.
Até um dia destes.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Um Chapéu que correu o mundo


Na Cascais dos anos 60, havia uma loja de modas.
Ficava à entrada da vila, junto ao belo café “Boca do Inferno”.
Pertencia a um tio de meu marido, alentejano de boa cepa, que veio cedo para Cascais. Aí casou, com uma irmã da minha sogra, teve filhos, estabeleceu-se e fez a sua vida. A loja, chamava-se “Casa Princesa”.
Ficava mal comigo, se não fala-se um pouco deste tio. Era alentejano, como já disse. Sem nunca esquecer a sua família de origem, nem o seu Alentejo natal, adoptou por sua, a família da mulher. Além de tio era padrinho do meu marido, a quem queria como filho e, ele adorava o tio Calado. A mim, adoptou-me também e, quando morreu, chorei-o como se fosse do meu sangue.
Era uma família unida, grande, num Cascais pequenino, diferente do de hoje, onde todos eram primos ou amigos.
Mas vamos à história.
A “Casa Princesa” era uma “Loja de Modas” à antiga, tinha tudo. Do botão à roupa feita, do tecido a metro a artigos de retrosaria, tudo.
Quando os turistas começaram a aparecer, o tio Calado, bom comerciante, juntou à mercadoria habitual, uma quantidade de artigos de artesanato, muito procurados pelos turistas. Toalhas bordadas, mantas, loiças regionais, chapéus, bandarilhas, objectos que os estrangeiros compravam como recordação.
A loja é hoje um banco, o tio foi embora, o “Boca do Inferno” é um pequeno Centro Comercial.
Há dias, o Vasco, que gosta de ir ao Ebay, ver e às vezes, comprar coisas, viu um curioso chapéu, que mostrava no interior, o seguinte: “Casa Princesa” J.M.Calado, Cascais. Telefonou alvoraçado, ao pai.
Resumindo: a Maria, maluca como sempre, nem pensou duas vezes, mandou vir o chapéu.
Hoje de manhã, o carteiro tocou, disse que tinha uma encomenda.
Vinha da Bulgária e, era o meu lindo chapéu de cavaleira, ou melhor, um chapéu do tio Calado, vendido, sabe-se-lá quando e a quem, que ao fim de muitos anos, voltou a Portugal, depois de ter corrido por aí, qual emigrante que um dia volta à terra.
Está em bom estado, como podem ver nas fotos.
Já tem lugar marcado na minha sala das recordações. É bom ter nas mãos, uma coisa que foi tocada, um dia, pelo meu padrinho de casamento.
Acho que o chapéu está contente, como eu. Voltou à sua terra, para as mãos de quem ao tocar-lhe, sentirá carinho, saudade, de quem um dia o vendeu.
Àquele que o conservou em bom estado, agradeço por isso.
Ao meu filho, agradeço por ter a mania de ir ao Ebay.
Ao meu marido, agradeço, por mais uma vez, ter ido atrás das maluquices em que me meto.
Tio Calado: A Maria, nunca o esquecerá. Não precisava do chapéu, para me lembrar de si. Tenho saudades suas e da tia. Mas agora, quando olhar para o chapéu, pensarei nele, como uma prenda, que os dois me tivessem dado.
João, Maria, meus queridos primos: o chapéu, será para mim, uma recordação muito querida. Venham cá vê-lo.
Agora, vou namorar um bocadinho o meu lindo chapéu preto. Depois, irá descansar da longa viajem que fez.
Até um dia destes.

sábado, 25 de abril de 2009

Tanto Mar


Sei que está em festa, pá

Fico contente

E enquanto estou ausente

Guarda um cravo para mim

Eu queria estar na festa, pá

Com a tua gente

E colher pessoalmente

Uma flor no teu jardim


Sei que há léguas a nos separar

Tanto mar, tanto mar

Sei, também, que é preciso, pá

Navegar, navegar

Lá faz primavera, pá

Cá estou doente

Manda urgentemente

Algum cheirinho de alecrim


Foi bonita a festa, pá

Fiquei contente

Ainda guardo renitente

Um velho cravo para mim

Já murcharam tua festa, pá

Mas certamente

Esqueceram uma semente

Nalgum canto de jardim


Sei que há léguas a nos separar

Tanto mar, tanto mar

Sei, também, quanto é preciso, pá

Navegar, navegar

Canta primavera, pá

Cá estou carente

Manda novamente

Algum cheirinho de alecrim


Chico Buarque

Até um dia destes.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

O Pintor, a Girassol e as Exposições


Ontem foi dia dedicado à Arte. Fomos às Caldas, às Gaeiras e a Óbidos.
Vimos as Exposições da Mizé, minha amiga de alguns anos.
Uma, no Centro Comercial Vivaci, outra na pequena, mas muito bonita Igreja de São Sebastião. Gostei, Mizé. Só tive pena de te não ver.
Depois, rumamos às Gaeiras, terra de bom vinho, de que meu pai muito falava. É uma terra bonita, de que falarei um destes dias.
Aí, num velho lagar, uma exposição de Arte Sacra, bastante completa. Um dos artistas é António Rodrigues (o Pintor) e a Girassol, sua mulher. Gostei muito dos quadros dele, da peça de cerâmica dela e, deles. A Girassol, era minha conhecida dos blogs, ficámos amigas num momento. Ele, é extremamente simpático e afável. Foram momentos muito agradáveis.
Vejam as fotos e pensem ir vê-las, lá. A viajem é curta e vale a pena. É fácil encontrar o lagar, mas qualquer pessoa, vos dá informações. É um local, onde se usa falar a quem passa.
Um pouquinho abaixo, outro lagar mais pequeno, transformado em atelier de Escultura cerâmica, onde está a Paula Clemente, um encanto de menina, com ar doce e frágil e, umas mãos que nasceram para fazer pequenas obras de arte, que apetece trazer para casa. Também é fácil lá chegar. Até por que, num e noutro dos lagares, sem rivalidades parvas, se indicam um ao outro.
Vi mais coisas bonitas, mas ficam para outro dia.
Hoje, só falo das exposições e dos artistas. Eles merecem.
Vá, amigos! Daqui lá é um saltinho. Um passeio de Sábado ou Domingo, com muita coisa bonita para ver.
Mizé, Pintor, Girassol e Paula, a Maria quando promete, cumpre.
Espero ter aberto o apetite, a alguns amigos. Parabéns para todos.
Gostei muito. É bom saber, que não é só em Lisboa, que há bons artistas e boas mostras de arte.
Vá lá. Espantem a preguiça e vão ver. Não se vão arrepender, por certo.
Até um dia destes.

domingo, 19 de abril de 2009

Cartas, postais e outras coisas mais

Pois é, amigos. No meu tempo, (pareço a minha avó), não havia E-mails, nem muitos telefones, os comboios eram lentos, os carros poucos. Quando a família estava dispersa, os amigos longe, escreviam-se cartas, postais ou, em caso de notícia impotante como, nascimento, morte, doença grave, ia-se ao posto de telegrafo mais próximo e, enviava-se um telegrama. Estes, eram pagos conforme o número de palavras ou sílabas, não me lembro bem. Eram curtos. Tipo: “Menino nasceu stop Mãe e filho bem stop. Beijos stop.” Ou: “Tia Hermengarda morreu stop Funeral amanhã stop.” Também havia alguns que davam felicitações pelo nascimento do Bebé, ou “As sinceras condolências”, pela morte da tia Hermengarda.
Os postais eram de dois tipos: Lisos, onde se mandavam recados breves, ou ilustrados, que eram enviados nos aniversários, sobretudo às crianças. Estes, eram muito giros.
Agora as cartas. Havia muitos tipos de cartas. E até havia livros, que ensinavam a escrevê-las. Assim, havia as Cartas Comerciais, as familiares, as dos amigos e... as mais célebres de todas: “Cartas de Amor”. Estas até tiveram direito a canção romântica e frase de poeta célebre: “Todas as cartas de amor são ridículas. Se não fossem ridículas, não seriam cartas de amor”. Opinião de Fernando Pessoa, como todos sabem.
Esperavam-se cartas, dias e dias, liam-se com emoção e ternura, guardavam-se numa gaveta, religiosamente. Tenho cartas com mais de cem anos. Vindas de longe, de perto, com envelopes enfeitados e estampilhas (selos) lindas. Tenho cartas de amor, atadas com fitinhas de seda, azuis, as que recebi do meu marido, rosas, as que eu lhe mandei. Em quatro meses, escrevemos cada um, cento e tal cartas. É ainda com a mesma ternura que as leio.
E não as acho ridículas. Talvez porque são nossas, talvez porque não sou o Fernando Pessoa.
Agora digam lá, que romantismo há num maill ou num SMS, cheios de palavras cortadas, inventadas, sem alma?
Quando recebo uma carta, é sempre uma emoção.
Há dias recebi uma de um amigo. Abri-a, li-a, tornei a ler e está guardada.
Só aí, eu vi as saudades que tinha, de receber uma carta de papel, escrita para mim, só para mim.
Não era do banco, nem da SMAS, nem da EDP, nem da Lisboagás. Não eram promessas da cura radical de todos os meus males. Não era o reclame daquelas máquinas que fazem tudo.
Era uma carta escrita só para mim, com o meu nome no endereço, o nome do amigo, no remetente.
Começava:
Lisboa, 2009...
O resto? Não queriam mais nada! A carta é minha.
Até um dia destes.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Às vezes não sei se vale a pena


Sempre gostei de limpar a casa. Quando era pequena, contava minha mãe, guardava os meus pequenos utensílios, junto aos verdadeiros. Assim que via alguém agarrar na vassoura e na pá, fazia o mesmo. Imitava tudo quanto faziam e adorava limpar o pó.
Ainda hoje, com estas mãos doentes, que nem escrever à mão me deixam, continuo a gostar de limpar o pó. Tenho uma empregada que aspira, encera, lava vidros e paredes, passa a ferro, cose a roupa, mas há duas coisas de que não abro mão: limpar o pó e cozinhar. A parte de cozinhar, às vezes precisa de ajuda, para descascar, cortar, picar cebolas etc. Mas o pó, não. Aí, não quero ajudas. Não gosto que me mexam nos livros, nos bibelots, que me mudem a disposição das fotos, das caixas, das jarras. É uma autêntica paranóia. Chego ao fim, com os pulsos doridos, os dedos dormentes, mas feliz.
Às vezes penso se vale a pena. Daqui a dias, lá estou eu, com espanadores de vários feitios, panos com creme de limpeza, panos sem creme de limpeza, pincéis pequenos, para os objectos mais frágeis, pincéis grandes, para os móveis torneados, limpa metais, sei lá que mais. Depois, olho em volta, contente com a obra. Agrada-me ver o escuro dos móveis, brilhar, agrada-me ver os livros alinhados nas estantes, agrada-me olhar as fotos e quadros queridos, sem pó, nem marcas das moscas.
Trabalho prosaico? Não é. Enquanto o faço, a minha cabeça está livre para pensar. Consigo trabalhar com as mãos, deixando o pensamento voar para longe, ou perto, às vezes. Posso ir imaginando o fim do livro que estou a ler. Posso pensar em qualquer coisa, para aqui escrever. Posso sonhar que um dia, o mundo será belo e haverá Paz.
Não me digam que limpar o pó é chato. Como vêm, para mim, é um trabalho divertido e produtivo. Este post chato de hoje, foi todo imaginado a limpar o pó.
Até um dia destes.

terça-feira, 14 de abril de 2009

A Velha Cigarreira


Há uns sete anos e tal, na última vez que fui a casa de meu pai, após a sua morte, foi-me entregue um saco cheio de tralha, para eu deitar no caixote do lixo. Não o fiz. Tralha ou não, eram coisas dele e, por isso mesmo sagradas para mim. Trouxe o saco para casa e guardei-o, sem coragem de ver o que continha. Tempos mais tarde, abri-o e, encontrei as mais variadas coisas. Desde uns velhos suspensórios a papéis, (alguns já aqui apareceram), havia tudo.
Entre essas coisas, estava esta cigarreira em pele, trazida de Espanha por um amigo. Arrumei-a numa gaveta sem a abrir.
No dia de Páscoa voltei a vê-la e lembrei-me, de que me daria jeito, para transportar os meus “Gauloises”, que dentro da barafunda que é a minha mala, geralmente ficam amarrotados, ou partidos.
O Vasco estava ao pé de mim, abriu a cigarreira e, disse-me: “Mãe, isto tem cigarros”. Peguei-lhe e um cheiro que eu conhecia muito bem, entrou-me pelas narinas e exclamei: “Mas isto são cigarros de mortalha!”. Eram. O meu pai, durante anos, fizera os seus cigarros, com mortalha e tabaco de onça. Lembrei-me do meu primeiro cigarro, igual àqueles. Eram cinco os cigarros. Tirei um e acendi-o, enquanto o Vasco me dizia: “Mãe! Isso deve estar estragado. O avô não fumava há muitos anos e, isso deve estar aí há que tempos:” O cigarro estava a saber-me deliciosamente bem. Ele, aspirando o fumo com ar guloso, olhava para mim. Por fim, tirei outro cigarro e dei-lho. O meu filho mais novo, que só gosta de cigarrilhas e, de vez em quando um “Gauloise” se eu lhe dou, fumou aquele velho “petillo”, deliciado. No fim dos cigarros fumados, havia uma gotinha de água, nos olhos dele e nos meus. Para mim, foi a lembrança do 1º cigarro dado pelo meu pai. Para ele, o 1º cigarro feito pelo avô, que é um dos seus ídolos. Quer acreditem ou não, o gosto era o mesmo, o cheiro também, só nos faltou a companhia dele. Por momentos, pareceu-me senti-lo.
E foi assim, que num domingo de Páscoa, eu fumei um cigarro, com perto da 40 anos, feito pelo meu pai.
Até um dia destes.

sábado, 11 de abril de 2009

Sexta-feira da Amizade


Costuma ser um dia um pouco triste. Lembra-me a morte, não só de Jesus, como outras mortes que têm marcado a minha vida.
No tempo do meu pai, a Páscoa era festejada em casa dele. Na quinta-feira, a que ele chamava, “quinta-feira das matracas”, (lembranças do tempo de menino em Óbidos), começava a Páscoa.
Reunidos em volta da mesa, as recordações vinham em catadupa e, a conversa durava até às tantas. Na sexta-feira, era obrigatório o bacalhau (único peixe que ele gostava). No domingo era a grande festa. O borrego assado, o Pão de Ló de Ovar, os folares, com ovos em cima, as amêndoas.
Depois dele morrer, todas as datas festivas, Natal, Páscoa, passaram a ser-me, não direi indiferentes, mas diferentes. Sem a alegria dele, sem o seu poder de aglomerar gente, nada faz muito sentido.
Ontem, preparava-me para passar mais uma sexta-feira santa, igual às outras, mantendo apenas, o ritual do bacalhau.
O meu filho disse-me que a Nemy, vossa conhecida dos comentários que aqui faz, se queria encontrar com ele. Conheço-a há muitos anos, de casa do meu pai, mas na confusão de gente que se juntava, nunca tinha calhado, termos grandes conversas.
Chegou perto das cinco, com um ar doce de menina, um livro e três rosas. Abraçamo-nos, num abraço longo, como duas amigas, que tendo-se perdido há muito, se reencontram. Tomámos chá e comemos o bolo que o Vasco fizera, a conversa desenrolou-se, fluiu, como se nunca tivesse havido separação.
Durante todo o tempo nem dos cigarros me lembrei. Sei que quando pensava serem horas de jantar, era meia-noite.
Bebemos mais chá, pão e bolo e... eram perto das duas da manhã, quando ela foi para casa. Ficou muito por dizer, Nemy. Agora que te reencontrei, não vou voltar a perder-te. Devo-te um dia muito bom.
Foi uma volta ao passado, uma volta pelo presente, em que vocês todos não foram esquecidos. Foram trocas de Sites e Blogs, perigos e vantagens da Internet, sei lá.
Passei uma tarde e noite lindas, como há muito não passava.
Obrigada Nemy, pelo livro, pelas rosas e, sobretudo pela tua presença. Volta depressa.
Mais um vez, Feliz Páscoa para todos.
Até um dia destes.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Feliz Páscoa, amigos



Não vos vou aborrecer com palavras minhas.
É de novo Torga quem vos fala, em dois poemas.

Páscoa

Anho do sacrifício
Que o ritual impõe,
É um balido discreto que lhe pedem
Homens e deuses, feras fraternais:
Que o perfume
Dum lírico queixume
Enterneça os fiéis sentimentais.

Mas o cordeiro agónico protesta.
E a paz familiar da festa
É perturbada.
A violência
Tem de ser friamente consumada.

Junta-se então,
No altar da imolação,
A pura crueldade
À impura liturgia,
E o sangue do poeta assassinado,
A correr como verso derramado,
É um hino rubro à eterna rebeldia.

Miguel Torga “Câmara Ardente”

Hossana!

Junquem de flores o chão do velho mundo:
Vem o futuro aí!
Desejado por todos os poetas
E profetas
Da vida,
Deixou a sua ermida
E meteu-se ao caminho.
Ninguém o viu ainda, mas é belo.
É o futuro...

Ponham pois rosmaninho
Em cada rua,
Em cada porta,
Em cada muro,
E tenham confiança nos milagres
Desse Messias que renova o tempo.
O passado passou.
O presente agoniza.
Cubram de flores a única verdade
Que se eterniza.

Miguel Torga “Cântico do Homem”

Até um dia destes.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Freixo de Espada à Cinta


Freixo, teve o seu primeiro foral, dado por D. Afonso Henriques. A este 1º foral, juntaram-se mais tarde, duas declarações de D. Sancho II e D. Afonso III, que confirmavam a posse dos mesmos foros. Em 1512, novo Foral de D. Manuel I garante todos os direitos ao local.
Conta a lenda que, durante as escaramuças entre D. Dinis e seu filho D. Afonso, o rei se terá sentado a descansar à sombra do freixo, encostando a espada ao mesmo. Assim teria nascido o nome da bela terra “Freixo de Espada à Cinta”.
Durante algum tempo, pôs-se a hipótese, completamente posta de parte, de aí ter nascido Luís de Camões. Há até uma quadra que reza:


Em Freixo de Espada à cinta
Nasceu Luís de Camões
Sua mãe, D .Jacinta
Negociava em melões.


Ora, nem a mãe de Camões se chamava Jacinta (Ana Vaz era seu nome), nem negociava em melões, nem Camões lá nasceu. Histórias do povo.
Mas, se Camões lá não nasceu, Freixo não deixou de ser berço de grande poeta: Abílio Guerra Junqueiro, autor dos “Simples”, “A Velhice do Padre Eterno” e outros.
Chegámos a Freixo, cerca do meio-dia. Esperava-nos um senhor do turismo local, que simpaticamente, nos levou ao mais importante miradouro da zona: “ Cabeço Durão”. A uma altura de 550 metros, caindo a pique sobre o Douro Internacional, a vista é impressionantemente bela. É o Douro em toda a sua rudeza e majestade. Avista-se uma barragem espanhola, de nome São Ceide, se não fui mal informada.
Voltamos a Freixo para o almoço. Casa antiga, muito bonita no exterior e no interior, bem decorada com peças de mobiliário muito conservadas. Simpática e acolhedora, como a sua proprietária e cozinheira. Estava tudo impecável, desde as mesas, bem postas e bem fornecidas, aos empregados, que podiam dar lições de bem servir aos seus colegas de Lisboa. A “Casa do Conselheiro” teve nota 20.
E acabou a parte boa. Mal o simpático senhor do Turismo, se preparava para nos mostrar a Igreja, a Torre Heptagonal, alguém que ao que parece, mandava no grupo, indelicadamente, pôs fim à visita. Mal houve tempo de fotografar a Igreja por fora, a torre, o Pelourinho e Guerra Junqueiro. Mais meia hora e teríamos, ao menos, visto aquela Igreja por dentro, já que não dava para mais.
Depois, foi a corrida desenfreada até à “maravilhosa” área de serviço de Abrantes, onde paramos meia hora, para o motorista descansar e os necessários xixis. Estava toda a gente gelada, mal disposta, sem os gracejos habituais, sem sorrisos. Mas havia alguém feliz. O “senhor que mandava”, provou a toda a gente, como age, um verdadeiro “Gentleman”. Foi indelicado com quem só queria mostrar-nos um pouquinho da sua linda terra, armou em “Coronel da Gabriela” com os ex-escravos que levou a passear.
Pros mesmos, amigos, pros mesmos. Até um dia destes.