segunda-feira, 26 de abril de 2010

26 de Abril


Ontem seria dia de dizer alguma coisa. É costume, todos falam na maravilha que viveram nesse dia, ou no medo. Fui das primeiras. Disse várias vezes, que foi um dos dias mais felizes da minha vida. O meu País livre, sem mordaças, sem guerra, sem censura, livre enfim. Julguei que todos seriam mais felizes. Enganei-me. Os cravos murcharam, os cravas continuaram a cravar, os ricos voltaram mais ricos e os pobres cada vez estão mais pobres.
E ontem, dia 25 de Abril, eu só lembrava o “Triunfo dos porcos” de Orwell.
Os animais libertaram-se, e fizeram o seu código de conduta que aqui está:


1 .Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo.
2. Qualquer coisa que ande sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo.
3. Nenhum animal usará roupas.
4. Nenhum animal dormirá em cama.
5. Nenhum animal beberá álcool.
6. Nenhum animal matará outro animal.
7. Todos os animais são iguais

Tempos depois o código foi modificado e saiu isto:


2. Nenhum animal dormirá em cama com lençóis.
5. Nenhum animal beberá álcool em excesso.
6. Nenhum animal matará outro animal sem motivo.
7. Todos os animais são iguais mas alguns são mais que outros


Sem querer tirar ao Seve o papel de conselheiro de leituras, recomendo vivamente o livro. É pequeno e lê-se de um fôlego.
Tenho pena, mas não me ocorre mais nada.
Ontem não houve cravos para mim, nem sorrisos, nem alegria. Vi o Salgueiro Maia e não tive pena da sua morte prematura. Talvez fosse o mais feliz.
Sem alegria, sem cravos, até um dia destes.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Vou aqui e já volto


Vou onde? Adivinhem.


Amanhã à noite volto.

Beijinhos, bom fim de semana e... Até um dia destes.

Maria

quarta-feira, 14 de abril de 2010

As voltas que o mundo dá


Em 1867 tinha minha bisavó materna, entre várias outras coisas, uma quinta perto da Póvoa de Santo Adrião (documento da foto). Lá viveu os últimos anos da sua trágica e atribulada vida e lá morreu. Tinha uma filha pequenina, que ficou entregue à irmã mais velha, que por acaso era sobrinha da mãe. Confusos? Eu explico. Meu bisavô e trisavô, personagem que detesto sem nunca o ter visto, casou com uma sobrinha que lhe deu três filhos e morreu nova. Levou ele para casa, a outra sobrinha, irmã da primeira, para lhe criar os filhos. Em paga, resolveu dar-lhe mais que fazer e pôs-lhe uma menina nos braços. Ela adoeceu, ele caridosamente pô-la na tal quinta à espera da morte e casou com outra, que não era sobrinha. Estão baralhados? Olha se eu fizesse como o Camilo e me pusesse a contar a história da minha família toda!?. Hoje não conto. Já temos confusão que baste para um só dia.
Temos uma bisavó enganada, com uma filha pequenina, a minha avó, a irmã da minha avó, que por acaso também é minha bisavó (como? fica para outro dia), uma quinta desaparecida na bruma do tempo. A minha avó cresceu, casou, teve 11 filhos, morreu ela e o marido, deixando-os novinhos e sós. Isto também fica para outro dia.
Ora, quando o Corvo comprou a casa dele e me disse onde ficava, houve qualquer coisa que me chamou a atenção. No baú dos papéis descobri este documento. Descobri-o, e as suspeitas confirmaram-se. O sítio onde é a casa dele, fez parte da dita quinta.
Curioso não é? Andámos a investigar os limites da propriedade e bate certo. Quer dizer, a casa do Corvo é na quinta que foi da trisavó. Quem sabe no próprio sítio onde era a casa em que escondeu a sua vergonha (naquele tempo era assim que se chamava ter um filho sem ser casada), a sua doença, toda a solidão da mulher abandonada por um crime que não foi dela. Ele, como já disse, casou e deve ter sido muito feliz, teve outra filha, morreu muito velho.
Ai se eu fosse o Camilo!... Ele com alguns parentes e muito engenho, imaginação e arte, escreveu perto de 200 volumes. Eu tive uma família enorme cheia de dramas Camilianos, falta-me o engenho, a arte. A imaginação não faz falta, porque só a verdade dava uma data de volumes.
E pronto. Mais uma volta do mundo, mais uma história das muitas que guardo na memória e no velho baú dos papéis.
Não sei porquê, acho que há pessoas bastante baralhadas hoje.
Não vos prometo entrar em explicações, pela vossa sanidade mental. Um amigo de meu pai, um dia que ele lhe tentou explicar, que era primo de si mesmo, ia ficando maluco.
Até um dia destes.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Nunca mais vi futebol


Não gosto de futebol, já o disse várias vezes. Fujo de o ver até na televisão. Sou do Benfica por tradição familiar, também já o disse. Há outra razão para não ver. Sou perigosa, porque além de os meus acompanhantes ficarem com as canelas negras, visto eu dar pontapés quando o Benfica marca, ainda por cima, sempre que via o meu clube jogar, ele perdia. Mas o que verdadeiramente me faz não ver os jogos, tem outra história.
Em 94 ou 95, o Benfica jogou contra o Porto, numa final em Coimbra. O Vasco estava na altura na Lousã, na colónia de férias, como todos os anos. Devo dizer, que ele não é muito de futebóis.
Nessa noite, estava eu a ver o jogo, que o Benfica perdeu 5/6, rebenta uma saraivada de garrafas, pedras, entram e saem bombeiros com macas, a polícia intervém, eu vi montes de putos saírem de maca e escoltados pela polícia, e eu sentadinha no sofá exclamo: “olha para isto. Estão as mães em casa muito socegadas e os miúdos ali. Havia de ser comigo, havia!”. Fui deitar-me calmamente, dormi, e no dia seguinte telefonei para a colónia à hora de almoço, como sempre. O Vasco atendeu, falámos das coisas do costume, se comia, se estava a gostar... depois perguntei-lhe: “viste ontem o jogo na televisão?” Ele hesitou, mas por fim disse-me: “ não, não vi na televisão. Estava no estádio.” Fiquei trémula, gaga, sem palavras. Na minha cabeça só havia uma ideia: onde estava o meu instinto maternal naquela noite? Eu era uma mãe descansada, com o meu filho a correr perigo. Ele lá me explicou que o monitor, logo que começou a barafunda, os tinha posto a salvo. Ralhei, desliguei e tive uma crise de choro à moda antiga. Na minha cabeça continuava a interrogação: “mas onde tinhas o instinto maternal ontem? Onde?.” E foi assim que nunca mais “fui” à bola com o futebol.
Até um dia destes.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Queres uma Amêndoa, Mãe?


Habituei-me a ver estas de licor desde que me conheço. Todas as Páscoas, o meu pai as oferecia à minha mãe em bonitas caixinhas, juntamente com uma moeda de dez escudos, daquelas da caravela. Os da minha idade sabem do que falo. Aos outros só direi que, nesse tempo, dez escudos era algum dinheiro. Foi juntando estas da Páscoa e mais umas tantas que arranjou, que minha mãe comprou a mobília do meu quarto e da minha irmã. Mas voltemos às amêndoas. A minha mãe, que tudo repartia com os filhos, era avara com as “suas” amêndoas. Uma por dia e já gozávamos.
Um dia estávamos a ver fotos antigas, guardadas nesta caixa grande, e perguntei-lhe de que era a caixa. Então soube a história toda das caixinhas e das amêndoas. O padrinho, todos os anos na Páscoa, lhe enviava uma, juntamente com uma libra de cavalinho. Já não sou do tempo dessas moedas, mas valiam bastante.
Um dia contou ao meu pai, e ele prometeu-lhe que teria todos os anos as “suas” amêndoas e uma moeda, não de libra, mas o que ele pudesse. Assim foi até quase ao fim. Morreu na véspera do Domingo de Ramos, não chegou a ter amêndoas nesse ano.
Depois de casar, contei isto ao meu marido. Agora sou eu a dona das figurinhas de açúcar e licor. Já não vêm em caixinhas bonitas, mas sabem ao mesmo licor, açúcar, infância e mimo de mãe.
Tudo na minha vida sabe e cheira a passado.
Queres uma amêndoa, mãe? Vá lá, tira uma pombinha.
Até um dia destes e boa Páscoa para todos.
Maria