quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Gente da minha Terra 2

  Lionel Carvalhais





Houve figuras na minha infância que nunca deixarei de lembrar, com imenso carinho.
Um deles, foi precisamente Leonel Carvalhais, conhecido como Nené Cebola. Muitos o lembraram ainda.
Quem viu o filme "Encontro de Irmãos" e tiver tido o privilégio de conhecer o nosso Nené, saberá que, em Tomar houve um Rainman. Dava pelo nome de Senhor Lionel ( com i mesmo) Carvalhais.
Era um homem pequeno, magro, de óculos grossos, cabelo curtinho, com alguns tiques, extremamente educado e delicado. Vivia com a irmã, que fazia umas deliciosas bonecas, que eu cobiçava e nunca tive. Do que ganhavam com as bonecas e da enorme memória dele, viviam.
Nesse tempo, os telefones eram raros e não havia listas telefónicas. Em Tomar havia.
O Senhor Carvalhais, sabia de cor, todos os nomes, moradas, números telefónicos, de Tomar e Ferreira do Zêzere.  Fazia umas listas à máquina e, vendi-as.
Tinha mais surpresas, este amigo. Se lhe dissessem o nome completo, de imediato ele dizia quantas letras tinha o nome. Fazia contas de cabeça, mais depressa que qualquer máquina.
Vendia as listas a 7$50 cada. Não sei se isso lhe melhorou a vida. Aos tomarenses dava muito jeito.
A última vez que o vi, num café em Tomar, tinham passado mais de 30 anos da minha saída de lá. Conheci-o e não resisti ao impulso de me aproximar dele. Disse-lhe apenas o nome do meu pai e, prontamente, sem hesitar, disse o local de trabalho, a morada e os números de telefone dos dois locais. Comovi-me. Um café partilhado, um longo aperto de mão, uma vénia respeitosa dele. E foi a última vez que o vi.
Rainman de Tomar? Não. Apenas o nosso, muito nosso, Nené Cebola, Lionel ( com i, volto a dizer) Carvalhais.
Até um dia destes.









domingo, 10 de fevereiro de 2013

Adeus meu querido primo


Ontem morreu-me um primo. Era um ser especial. Nasceu com Trissomia 21.  Isso nunca teve influência no amor que lhe tínhamos.
Quando nasceu, eu tinha 6 anos. Não percebi diferença nenhuma entre ele e os outros bebés. Era um bonequinho de carne e osso, que eu adorava ter ao colo.
Foi crescendo, fui vendo algumas diferenças, mas isso nunca afectou o meu amor por ele. Muito meigo, muito educado, muito sedento de atenção e de ternura. Tudo isso teve, da parte da mãe e de todos. A mãe, a minha madrinha, que morreu há meses, não se limitou a tratá-lo com desvelo. Era uma Mulher de fibra e muito inteligente. O Henrique, era esse o seu nome, aprendeu a ler, escrever e fazer contas. Teve emprego. Era um cavalheiro a sério, daqueles que puxavam as cadeiras às senhoras,  curvavam-se para cumprimentar os mais velhos. Tinha gostos musicais definidos, era Dragão ferrenho. Claro que era teimoso, como toda a família, claro que, por vezes, se irritava como todos. Foi feliz. Disso tenho a certeza.
Nunca me esquecerei, de uma longa conversa, que tivemos um dia.
Foi no dia de anos do meu pai, a casa estava cheia, a mesa não dava para todos. Decidiram, que os mais novos, iriam para outra sala e claro, outra mesa. Alguém, que não tinha Trissomia 21, mas era estúpido, mandou o Henrique para a mesa dos miúdos. Ele não gostou. Afirmou-se adulto e disse que estavam pessoas mais novas na mesa. Referia-se ao meu sobrinho mais velho. Este, de imediato se levantou e trocou de lugar com ele.
Depois do almoço, estivemos os dois a conversar. Aliás, ele falou, eu ouvi. O que ele me disse nesse dia, fez-me abrir mais uma janela na perede dos preconceitos, que infelizmente, todos temos.
Resumindo: “Eu sei que sou diferente. Mas acho que tenho o direito de ser respeitado como os outros. Falo de uma maneira diferente, penso de uma maneira diferente, mas não sou burro e mereço respeito”. A conversa foi longa. Esta frase dele, resume-a. Ele era mais inteligente do que muitos, que se riam das palavras um pouco atrapalhadas, das pequenas manias, que afinal, todos temos.
Muito mais haveria a dizer do Senhor Henrique, como os estranhos lhe chamavam. Muitas lembranças do meu Quico, que vão ficar sempre comigo, muitas saudades.
Esta é a minha dspedida do meu primo mais novo. Gostava de lhe ter dito mais vezes, como gostava dele, mas ele sabia-o bem.
Beijos, Vera, Zé Manel, Ninon.
Um último beijo, meu querido Quico.
Maca (era assim que me chamavas)
Maria


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Gente da minha Terra 1


O Orador, o Empresário, o Hipnotizador e o Romântico

Hoje são 4, as figuras de Tomar do meu tempo. Sei pouco deles, apenas algumas histórias. Não tenho fotografias, nem documentos, só lembranças.
1º- O Orador - Chamava-se Manuel, por alcunha o “Jeitoso”. Tinha uma irmã, de seu nome Laurinda, “Jeitosa”, que levava o dia, com 2 latas ligadas por um cordel, penduradas ao pescoço. Batia nas latas com dois paus, não falava, mas toda a gente a conhecia. O irmão, não gostava da alcunha, ficava zangado, quando o tratavam por “Jeitoso”, bebia um bocado e, fazia discursos, que começavam invariavelmente assim: “Quem manda é Deus e Nossa Senhora. E em Tomar, quem manda, é o  Senhor Capitão Oliveira”. Depois, o discurso continuava, longo, ilógico, com algumas verdades pelo meio.
2º- O Empresário - Não sei o nome, mas a alcunha era “Troca a Nota”. Também bebia o seu copinho, mas parvo não era.
Um dia, alguém lhe propôs, fazer uns buracos no Mouchão, para espetar os paus que, iriam servir de base, às ornamentações, de uma das muitas festas, que se faziam em Tomar. Viu o trabalho, acertou o preço de cada buraco, (1$00 cada) e aceitou. Abriu 3 ou 4 buracos e, viu o irmão. Sem perder tempo com explicações, perguntou: “Queres ganhar umas coroas?” O irmão aceitou, ele disse-lhe qual o serviço e, que ganharia 50 centavos por cada buraco. Seguidamente, sentou-se na explanada da “Primorosa”, bebendo o seu copo e vigiando, o seu operário. Entretanto, passa a pessoa com quem ele tinha contratado o serviço que, lhe pergunta: “Então o trabalho?” A resposta, veio pronta e elucidativa: “Não se preocupe. Tenho pessoal a trabalhar por minha conta”. Enquanto respondia, apontava o irmão que continuava a fazer os buracos. E era parvo?
3º- O Hipnotizador - Também não lhe sei o nome. Era conhecido por “Dona Inês”. Porquê? Também não sei. Bebia como uma esponja. Acho que era o seu estado normal. À tardinha, ia à “Casa dos Pobres” buscar sopa, com uma panela. A essa hora, já as pernas não o ajudavam muito. Caía, largava a panela que, rolava rua abaixo, tentava levantar-se, caía de novo e, então, começava o monólogo, sempre igual, tentando convencer a panela, a ir ter com ele. Ela não ia, ele ralhava com a panela e, a cena durava até passar uma alma caridosa, que o levantava, apanhava a panela e, às vezes, o guiava, até à “Casa dos Pobres”.
4º- O Romântico - Chamava-se Martinho, era de Alcobaça, vivia na “Casa dos Pobres”, fazia anos no dia de São Martinho. Alto, magro, vestido de escuro, amparado a uma espécie de cajado, entrava na minha rua, a cantar: “Nesta rua vou entrandó, pra falar ó mê amori...”
Parava e, dizia: “Oh Martinho, põe-te a pau. Tás grosso, ó quê?”
Andava mais uns passos e, em frente de janela onde houvesse menina cantava: 
                           "Menina que estás à janela,
                             A comer teu pão com queijo
                             Faz dos braços uma arma
                             E atira-me lá um beijo”
Este Martinho, era o preferido do meu Pai, por ser de Alcobaça, como ele. Ao sábado, subia a escada do meu prédio e, eu era encarregada de lhe entregar, um pão com carne, um copo de vinho e um cigarro. O meu discurso era sempre o mesmo: “A mãe dá o pão, o pai dá o vinho, a menina o cigarrinho”. A menina era eu. Maldito cigarro! Já aos 3, 4 anos, fazias parte da minha vida.
No dia 11 de Novembro, dia de São Martinho, o meu pai, mandava-o entrar e dava-lhe almoço completo. Um dia, desapareceu. Disseram-nos que, estava em Alcobaça num Asilo.
Hoje, dediquei-me a estes 4 homens. Eram figuras de Tomar.
Diferentes, mas nunca maltratados por ninguém. Em Tomar, não se tratava mal ninguém. Brincava-se, com as manias de cada um, mas sempre com respeito, com amizade.
Ainda será assim? Não sei. Isto, passava-se, no tempo do “Nosso Capitão Oliveira”, como diria o Manel Jeitoso, e eu subscrevo.
Até um dia destes
Maria    



sábado, 19 de janeiro de 2013

Aniversário


                                            


                                     Minha irmã, minha amiga
                                     Foste-te embora sem dizer adeus.
                                     Fechaste os olhos doces num momento
                                     Abriste-os junto a Deus.


Hoje seria o dia dos teus anos.
Os Lírios do costume, a saudade cada vez maior, uma lágrima, um beijo.
Maga 

Até um dia destes
Maria  

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Há catorze anos, passei aqui, a meia noite.



Foi uma noite muito fria, mas senti-me muito feliz.
Parabéns Rafael.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Para ti, minha Margarida

No dia do teu aniversário, com toda a saudade e carinho, a nossa "Carmen"



Até um dia destes
Maria

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Papoilas






Um campo de papoilas sob o brilho,
Da luz dum sol de Primavera,
Lembrava colchas de retalhos muito antigas.
Cada folha cosida a outra folha,
Com ponto pequenino, feito à mão,
Parecia um pequeno coração
Ligado a outros, a muitos mais de mil.
Eram as colchas ricas de noivado,
Tecidas de ternura e ilusão,
Quase mantos de sedas e de brocados.
Agora, o tempo é escuro. Só lembram sangue,
O sangue, que cobre a terra de amargura
E deixa sobre ela, tanto corpo exangue.
Já ninguém faz as colchas de noivado.
Os corações, não batem já de amor.
As bombas caem, não há campo em flor,
Restam só corpos mortos, chacinados.
E é assim, que eu vou entristecendo,
Já não há alegria, nem beleza
Nos campos de papoilas sobre o mundo.
Já não consigo ver as colchas de noivado.
Só dor e um desespero, bem profundo.

Hoje estou como o tempo
Até um dia destes
Maria