terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Miúdos em dias de chuva


Hoje, falando com o meu filho mais velho, ele queixava-se que, o filho com onze anos se molhava de propósito. Isto transportou-me para muito tempo atrás, quando tinha a mesma idade e até mais anos.
Quando mudamos de casa em Tomar, fomos morar para um prédio acabadinho de fazer, na então parte Nova da Cidade. As ruas ainda não estavam feitas, eram barrentas, cheias de buracos, que com a chuva se tornavam poças de água. Da casa onde morava até à Escola que frequentava, era perto. Tinha, então, um belo impermeável vindo de Espanha, branco, com carapuço e quase até aos pés. Usava botas de carneira com tachas nas solas e, claro, um guarda-chuva, que eu usava para tudo, menos para me abrigar da dita chuva. Os pés, fosse porque razão fosse, entravam em todas as poças. Algumas eram fundas e, a água entrava pelo cano baixo das botas. O capuz, nunca cobria a cabeça. O gozo de sentir a água escorrer cara e tranças abaixo, era imenso. Chegava a casa feita pinto molhado. Claro que ouvia raspanete. Claro que apanhei algumas constipações. Mas o prazer de sentir a chuva na cabeça e na cara, patinhar em tudo quanto era buraco, faziam-me esquecer o resto. As tranças molhadas a bater-me no rosto, a sensação de liberdade de as ver dançar ao vento, como cordas molhadas, são lembranças que não esquecem. Agora, fujo da chuva e do vento e nem me atrevo a enfrentá-los. Mas aquele prazer está na minha memória marcado como uma lembrança muito boa.
Por isso entendo o meu puto. Que importa uma constipação, comparada com a liberdade de apanhar uma valente carga de água?
Afinal, as crianças não mudaram assim tanto. E eu, pelos vistos, continuo, por dentro, a ser a “trancinhas” maluca, garota, que tem uma pena danada de já não ter coragem de se meter debaixo de chuva, com os pés dentro de água e um guarda-chuva fechado na mão.
Até um dia destes.

21 comentários:

Unknown disse...

Olá.

Tudo visto, revisto e... aprovado.
Menos o chapéu-de-chuva... Para quê tal empecilho?

Há lá coisa melhor que uma valente carga de água a escorrer pela cara abaixo?

Maria disse...

Olá amigo Alfredo

O guarda-chuva servia de pára-quedas, de bengala, de arma de defesa.
Gostei de ter notícias tuas.
Beijo grande
Maria

Laura disse...

Ahhh, Maria, levaste-me de volta aos meus 8 e 9 anos, no Entroncamento, quando chovia e por vezes o guarda chuva ficava esquecido nalgum canto da escola, jesus, que bem sabia meetr as botas nas poças dágua, até a pasta de cabedal, ia atrás, atirava-la ao ar, e catrapumba, caía prá li que nem sei. Um dia a mulher d eum amigo do meu pai, tinham um café chamado Cú da Mula, tal e qual, viu-me a passar, veio á rua bucar-me, ralhou com jeitinho para que não me molhasse mais, ó laurinha, olha para esse calçado...e eu bem olhava ams não me ralava nem com os pés gelados, as meias, a pasta a escorrer água, ai Maria, que belas recordações...e o teu neto é como nós, gosta da sensação de superioridade, olhando os outros todos tapadinhos de guarda chuva e nós, ahhh fazendo frente à chuva, pegando-a pelos cornos, como soe dizer-se, deixa lá as constipações, por dá cá daquela palha, porque não apanhar algumas com uma justa causa?...
beijinhos e abraços e que bom que melhoraste..laura

Maria disse...

Querida Laura

Isto de ter netos, leva-nos, por vezes, ao passado distante. Quem me dera nesse tempo. Hoje, fujo da chuva, como os gatos. Detesto o vento e, nesse tempo, adorava senti-lo na cara, nos cabelos, fazer voar os guarda-chuva das senhoras, virá-los. Agora nem vento, nem chuva. Só o calorsinho da minha casa. Às vezes, deitada e quentinha, oiço o vento e a chuva e, o pensamento foge-me para os desabrigados. Penso como se sentirão e fico triste, muito triste, porque todos deviam ter direito a um teto, uma cama, uma sopinha quente.
Há dois aqui perto, que me fazem sofrer. Dormem debaixo de uma varanda, com um monte de trapos e cartões, por abrigo. Já quis falar com eles, mas o cão deles é enorme e morde quem se aproxima. Dizem que já os tentaram tirar dali mas, não querem. Vidas!
Beijinho
Maria

Vasco disse...

Também gostava de ir para o meio das poças de água, mas com as galochas, para não molhar os pés; escorregar pela lama abaixo, com um cartão por baixo. O pior era qundo corria mal. Mas nada melhor que uma boa desculpa - "caí", "escorreguei"...
Mas hoje, por exemplo, não gostei nada de ir para o meio da chuva e do vento...

Beijinhos.

Maria disse...

Meu Corvo

Chegavas lindo, chegavas. A tua sorte era eu me lembrar do que tinha feito.
Houve um dia, que até a cabeça tinhas lama.
Beijinhos
Mãe

Osvaldo disse...

Maria;

Haverá criança que nunca correu, dançou e pulou debaixo de uma carga de água. Haverá algo mais excitante que na saída da escola ver esse "bando de pardais à solta" numa grande algazarra pular e se encharcar em todas as possas cobertas de água no meio de uma valente chuvarada de verão?!...

E haverá filme mais belo que "Singin'in The Rain" (Cantando na Chuva) com Gene Kelly e Debbie Reynolds?...

Obrigado, Maria, por nos lembrares que também todos nós já fomos (e ainda somos)... crianças.

bjs e abraços para o João e Vasco.
E o mano como vai? Dá-lhe um abraço também.
da Anita e Osvaldo

Laura disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Alva disse...

Ai Maria, faço sempre isso!
Ainda hoje apanhei uma valente carga d'água simplesmente por prazer!

Sabem tão bem estes momentos que ainda tenho direito... :)

Muitos beijinhos para ti Maria,
Fica bem,
Estrela d'Alva

Kim disse...

Oh Petite, isso era exactamente o que eu fazia. Tudo o que era chaboca, levava a minha pegada.
Mas tem piada porque assim foi ao longo da vida. Sempre gostei de jogar à bola à chuva e quanto mais chovesse mais eu gostava. Pelo menos até aos 40 anos joguei à chuva. Depois comecei a jogar em pavilhões fechados e isso já não acontecia, com pena minha.
Não te esqueças que estamos na mesma escala de saudosismo
Beijinho à Petite Marie das trancinhas.

xistosa, josé torres disse...

Será uma "doença" da adolescência?
É que recordei exactamente o que fazia.
Não era em Tomar, mas Castelo Branco e se a chuva era fria.
Recordo também uma molha em Angola (na tropa).
Não nos podíamos mexer do local onde estávamos, (no mato).
De repente despencou-se um autêntico diluvio, como era apanágio.
Encostei-me a uma árvore e esperei ... quando o sol brilhou, deitei-me de papo para o ar.
E gostei de ver a evaporação da água ... é uma imagem que nunca mais perco.
Ainda hoje se não usasse "montras" não usava guarda-chuva ...
Cumprimentos.

Maria disse...

Osvaldo

As lembranças da infância são todas tão semelhantes! Era um prazer enorme fazer o que nos era proíbido. Apanhar chuva, molhar os pés, roubar fruta verde dos pomares, trepar árvores...Nunca mais voltaremos a ter 11 anos, mas as maluquices dos netos levam-nos a recordar e, afinal, recordar é um pouco viver de novo.
O meu irmão vai melhorando aos poucos, mas já faz uma grande diferença.
Abraços do João e do Vasco e beijos para a Anita e para ti da
Maria

Maria disse...

Estrelinha querida

Tu ainda sabes bem, o prazer que dá uma boa chuvada, só por prazer. Estás na idade disso. Goza bem esse e outros prazeres da vida, porque mais tarde, vais lembrá-los com a mesma alegria que a Maria velhota. Aproveita bem, a tua mocidade, meu Anjo. É a nossa altura mais feliz e, às vezes, só tarde o sabemos.
Beijinhos pequenina
Maria

Maria disse...

Kim

Quem de nós, não andou à chuva, ao vento? Quem de nós, não recorda esses momentos com um sorriso de felicidade e de nostalgia?
Pelos comentários que recebi até agora, ninguém.
A infância e a adolescência são momentos sem igual.
Olha, lembrei-me agora que, a primeira vez que eu e o João nos beijámos, chovia a potes. O guarda-chuva caiu e, ela caia-nos em cima. Nem demos por isso.
A chuva traz-me recordações malucas e felizes.
Beijinho da Petite Marie, sem tranças, mas igual por dentro.

Maria disse...

Xistosa

Benvindo ao meu cantinho. É o que eu digo, todos diferentes, todos iguais. Quer dizer, digo eu e a Benneton.
Obrigada pelo comentário e a partilha de lembranças. Volte sempre.
Maria

Anónimo disse...

Petitamiga

Mesmo quase de partida, com uma porrada de preparativos à mistura, ainda te venho dizer que, ontem, em Campo de Ourique, mais precisamente em frente do Canas, assisti ao que de seguida conto.

Tinha ido com a Raquel - que tinha coisas a fazer na Charles - e fiquei no carro à espera. Vindas certamente da escola, quatro miúdas dos seus 11/12 anos gozavam à doida: só uma tinha um chapeu-de-chuva, laranja e com a metade das varetas.

Todas tentavam abrigar-se debaixo dele; todas apanhavam a carga de água, felicíssimas. Nisto veio um puto, de mochila às costas - muito penam os gaiatos de agora... - casacão e capuz. No máximo dez anitos e minis.

Escorria-lhe uma catarata pelo corpo todo, mas principalmente pela cara rosada. Baixei o vidro e disse-lhe: «estás a apanhar uma molha...»

E o malandro todo lampeiro: «apanhar uma molha, ok; apanhar da minha mãe, nada!»

Quem me mandou ser parvo e meter-me onde não era chamado?

Abs & qjs para tu - ainda daqui

Maria disse...

Henriquamigo

Só se a mãe do puto não tiver memória. Todos nós fizemos o mesmo e, os putos afinal, não mudaram assim tanto. Há prazeres que nascem do sangue. E há lá coisa melhor que ter 11 anos e apanhar uma valente carga de água, molhar os pés nas poças, ficar transformado em pinto!
Hoje, se me caem uns pingos em cima, fico constipada, os ossos queixam-se etc. Mas que saudades de uma bela chuvada a cair por mim abaixo!
Boa viajem e cuidado com o frio. Parece que na Índia também chove e faz frio.
Divirtam-se, gozem bem a ida ao Oriente, vejam amigos e volta cheio de histórias.
Abraços dos homens, beijinho à Raquel e queijinhos para tu.
Maria

Laura disse...

E agora chove que sei lá, ams, chuva? hum, tá fria a água, tá vento, tá gelo, e em casa é que sabe bem, quando vejo os putos a molharem-se, ainda me rio com eles...sabe tão bem...Um abraço da flor de linho...

Anónimo disse...

Olá! Mudei de aposentos e prefiro agora não fumar dentro de portas. Por isso saio sempre para um cigarro, pelo menos à porta das traseiras. E o que encontro? Será chuva? Nem por isso... neva mesmo. E ainda está tudo branco dos últimos nevões. E o desejo de mergulhar naquela neve como nunca!?!?!

Maria disse...

Querida Laura

A chuva está fria, nós já não somos meninas e, já não temos coragem de a apanhar em cima.
Mas que Saudades desse tempo!

Maria disse...

F.G.S.

Romeiro, romeiro quem és tu?
Tomar banho na neve? Com cigarro na boca? Ficas transformado em semi-frio.
Obrigada pelo comentário.
Maria