quinta-feira, 22 de julho de 2010

As Avozinhas não morrem!


Era uma vez... Era assim que começavam as histórias, que repetias até à exaustão. Eu não me cansava. Conta uma história Vó!... E lá vinham os príncipes com orelhas de burro, os príncipes encantados que eram sapos e se transformavam em belos mancebos com o beijo da princesa, as princesas lindas e infelizes, que ao calor do beijo do belo príncipe, acordavam e eram felizes para sempre. Quase todas acabavam bem: “E foram felizes para sempre!...”
Eu adorava aquelas histórias tão parecidas, mas para mim diferentes, que me povoavam a cabeça de sonhos e ilusões.
Só havia uma, que nunca quis ouvir até ao fim. A avozinha morria.
Eu desatava a chorar, agarrava-me a ti e gritava: “Não Vó! Essa não. As avozinhas não morrem!” E não parava até tu me prometeres que não morrias nunca. Eras marota, sabes? Voltavas vezes e vezes a tentar contar a tal história, só para eu voltar a chorar, gritar e ter pesadelos.
O tempo foi passando, as histórias eram outras, eras a minha confidente, a pessoa a quem nunca mentia, com quem conversava tardes inteiras. Via-te cada vez mais velhinha, eu já era mulher e mãe de filhos, mas continuava a acreditar que tu eras eterna.
Estavas quase a fazer os 99 anos, e naquele Fevereiro frio, (como eu detesto este mês!), uma porcaria de gripe sem nome, atirou-te na cama. Eu via o medo na cara de todos, via sinais que infelizmente, já tinha visto noutros rostos queridos. Mas dentro de mim havia a minha frase de sempre e a tua promessa. Não, tu não ias morrer. Esqueci-me que tu sempre fizeras o que te dava na gana. Arrancaste o oxigénio, o soro e disseste: “Não quero mais”. Meia hora depois adormeceste para sempre. A princípio não quis acreditar. Revoltei-me contra ti e contra a vida. A dor foi muito forte. A surpresa também. Afinal as avozinhas, a minha avozinha, morriam como toda a gente. Agarrada a ti repetia: “Tu tinhas prometido Vó!”! Porque me mentiras?
O tempo passou, a dor não. Hoje farias anos. Não consegui falar das festas que fazíamos nesse dia. Muita gente, muito barulho, tu no teu cantinho recebendo amigos e parentes. Só via esta caricatura feita pelo meu tio Henrique em cinco minutos. Fui buscá-la e ela aí está. E tu estás lá toda. No cantinho das histórias, das confidências, dos teus bordados e rendas. Era a casinha de Arroios, a tua casinha.
Avozinha, minha Avozinha, como te queria hoje ver, levar-te flores, chocolates, um perfume! Como queria beijar a tua mão e dizer: “ A Benção minha Avó”. Sentir o teu beijo no rosto, a tua mão na cabeça, e ouvir-te dizer: “Deus te proteja minha neta”.
Nada disso vai acontecer. As Avosinhas morrem, afinal. Mas é em ti que vou pensar o dia todo. Talvez à noite, na hora de todos os prodígios, eu ouça a tua voz abençoar-me outra vez. Talvez eu te ouça dizer: “Era uma vez uma princesa...”
Adeus Avozinha, até para o ano.
Um beijo para o meu amigo Kim. Sei que o dia também é marcante para ele.
Até um dia destes.

27 comentários:

Zé do Cão disse...

Maria

Que post bonito.
Tenho a mesma opinião.

As avós nunca morrem, e estão sempre do nosso lado.

jinhos

Maria disse...

Zé amigo
As Avós não morrem dentro de nós.
Agora, com dois netos que são a luz dos meus olhos, ainda tenho mais saudades da minha.
Beijinho
Maria

Osvaldo disse...

Maria;
Tanta verdade neste teu post. E tanta ternura que dedicas às avós.

Claro que elas não morrem porque se isso acontecesse perderiamos todos os ensinamentos por elas transmitidos.

bjs, Maria e abraços para os homens da casa.
da Anita e Osvaldo

Maria disse...

Osvaldo
Só conheci esta Avó e foi das pessoas que mais me influênciou. Era muito inteligente e culta e sabia ensinar.
Ainda hoje penso nela, quando tenho que tomar uma resolução grave. Acho que enquanto eu for viva, a minha Avosinha viverá sempre.
Abraços dos homens e beijinhos para ti e Anita
Maria

Unknown disse...

Mariamiga

Vieste abrir a minha caixa, não a de Pandora, mas a de Portalegre, da Rua de Infantaria 22, onde moravam a minha Avó Maria e o meu Avô Braz. Do lado materno, pois os dois do lado de meu Pai, já tinham falecido quando eu nasci.

A minha Avó Maria sabia fazer umas fatias douradas que eram uma maravilha. Sabia muito mais. A Avó Maria era da Aldeia da Ponte, Beira Baixa. E era pequenina e magrinha, toda ela era actividade, frenesim, rapidez.

Mas o meu Avô Braz é que nos contava estórias. Era de Montalvão, era o Senhor Tenente da Guarda Fiscal, viera de soldado, tinha uns bigodes brancos retorcidos e ia ao pálio nas procissões.

Esta agora. Só tu me fazias recordar e ter saudades. Um empedernido como eu, não pode ter coisas dessas. Não deve.

Mas tu tens uma arte muito especial para me dares cabo das intenções e dos procedimentos. Vade retro...

Homabs e qjs para tu. A Raquel diz que temos de nos encontrar; não fui eu, foi ela, juro.

PS - POSSO METER-TE UMA CUNHA? OU ANTES PEDIR-TE UM FAVOR? SIM? SIM.

PODES PEDIR AO KIM QUE UM DESTAS DIAS PASSE LÁ NO MEU BARRACO E DEIXE UM COMENTÁRIO, COM O? 'TÓBRIGADINHO.

JÁ AGORA, O CC EMIGROU? PARA ONDE? PATAGÓNIA, RUANDA OU FREIXO DE ESPADA À CINTA?

Kim disse...

É verdade amiga, as avozinhas não morrem como também não morrem as mães. Ambas ficam grudadas em todos os sentidos do nosso corpo.
Também uma avó assim. Era apenas a pessoa mais querida da terra. Nunca me lembrei de publicar um post sobre ela. Fá-lo-ei.
Era uma vez ... também fazia parte da minha relação com ela. Eram avozinhas e está tudo dito.
Beijinho grande Petite Marie, (cada dia mais petite).
Não precisas de meter cunha nenhuma. O Henrique AF é tão abrangente nas suas crónicas que um simples mortal como eu se perde nela com facilidade. São vários posts num e eu não costumo comentar com monossílabos daí que acabe por nem o fazer. Por outro lado ele não é tão "saudosista" como nós e é muito mais acutilante nas suas acusações, o que não se passa comigo que nem sei como ralhar com o mundo. Vou transcrever isto para ele.
Bj

Alva disse...

Maria,

As Avozinhas têm sempre histórias dos seu tempo para nos contar.
Eu, tal como tu, também gosto muito de ouvir essas histórias que nos aquecem a alma!

Na minha sincera opinião, há ainda muito que aprender com as Avozinhas... há que aprender a sabedoria da vida!

A tua pequenina gosta muito de ti e manda-te beijinhos!

Laura disse...

As avozinhas jamais se vão. Dentro de nós estará sempre a casinha onde nos acolheram em amor, cuidaram, mimaram (no meu caso, tanto tanto) a avó laurinha era mais que mãe, deu-me o amor que a minha mãe não soube, deu-me a esperança de acreditar em mim, orgulhava-se da sua laurinha, gabava-me à farta enquanto a minha mãe, nunca na vida foi capaz de me dizer que estava linda num dia qualquer ou se estreasse um vestido, nunca na vida me disse que me amava como eu digo aos meus ninos, se lhes digo que os amo tanto, tanto e eles bisam comigo...o avô Manuel era igual, quando viviamos em Luanda, eu mandava fotos e cartas muitas cartas, ele metia no bolso e levava ao S, Porfírio um grande amigo meu desde que nasci...e falavam os dois de mim, o avô era uma ternura, ah, os avós nunca morrem não senhor, eles continuam a querer andar connosco pela mão, a querer ajudar nas horas do aperto, mas a vida é assim; uma sucessão de amor em amor!

Beijinhos minha querida Maria, muitos a todos, ao João e ao Vasco..da laura

Maria disse...

Henriquamigo
Eu obrigo-te a voltar à infância?
Tu, o durão que brinca com os seus próprios sentimentos? Não sou eu. Eles estão na tua cabeça e tu queres esquecer. Depois, vem a pequena formiga Maria, e faz com que tudo venha à memória.
O tempo de infância e adolescência são os mais marcantes da nossa vida. Felizes ou infelizes são eles e as pessoas que nós vimos primeiro, quem faz de nós o que somos. Às vezes a vida tenta mudar-nos, fazer-nos duros, mas no fundo nunca deixamos de ser meninos. Eu cultivo as minhas memórias com ternura. Elas são o sotão onde estão guardados os trastes velhos e inuteis, a que não damos valor, até descobrirmos que um ou outro móvel, um ou outro papel, nos levam num voo para a vida antiga. Nunca te aconteceu, abrir uma gaveta, achar um papel amarelo, lê-lo e virem-te lágrimas aos olhos? Pode ser uma carta, um rol da mercearia escrito pela mãe, um bibelot antigo, horrível, e ir buscar toda a história que lhe diz respeito?
É só isso que faço. Abro a porta do sotão que é a minha memória, e deixo o passado vir à luz.

O C.C teve exames, resolveu voltar a estudar, já está inscrito na faculdade e deve entrar em Setembro. Tem andado cansado. Ontem foi à praia com o Pai. Eu não fui porque detesto areia, multidões etc.
Quanto ao Kim, lê o comentário dele.
Agradece à Santa Raquel a ideia de nos encontrarmos. Gostava muito.
Abraços dos homens, beijinhos para Ela e queijinhos para tu.
Maria

Maria disse...

Kim
Quando alguém que amamos parte, leva um pedaço de nós, deixa um pedaço dela em nós. Avós, Mães, Pais, todos aqueles que nos deram carinho, amor, vivem enquanto os lembrarmos. É assim para mim, porque sem isso, já teria morrido.
Tenho o marido, os filhos, os netos, que são a minha vida, mas que faria sem a companhia dos outros, pelo menos na memória?
Ontem já me tinha lembrado de ti, porque sabia que a tua Mãe e a minha Avó faziam anos no mesmo dia.
Conseguiste falar da tua Mãe com o teu Pai. Eu falei da Avó com o meu irmão. É bom lembrar. Devemos-lhes isso. Tudo deram sem pedir nada. Amaram-nos porque sim.
Beijo meu amigo.
Maria

Maria disse...

Pequenina, minha Pequenina, como és sábia para a tua idade! É isso que me faz gostar de ti. Tu és uma mulherzinha sensível, com uma alminha pura e boa.
Gosto que gostes de mim. Eu também gosto muito da minha Pequenina, que é tão grande em algumas coisas.
Beijinhos
Maria

Maria disse...

É verdade querida. Os Avós andam sempre connosco. Pela mão deles vimos tanta coisa! Do seu saber, aprendemos muito. Da sua ternura nos veio a ternura que sentimos agora por filhos e netos.
Tu e a Avó Laurinha, eu e a Avó Aldinha. Nunca me faltou amor da minha Mãe. Morreu cedo e faz-me uma falta enorme. Quando a perdi quase fiquei doida. Todos me fazem falta, de todos tenho saudades e lembranças boas. Fui muito mimada por muita gente. Talvez por isso, tenha a sensibilidade tão à flor da pele e o coração ao pé da boca, que às vezes devia estar calada e não está.
Beijinho, minha Flor
Maria

Vasco disse...

Mãe, acho que já não é a primeira vez que te digo que tenho pena (pena é pouco) de não ter conhecido a avozinha. De certa forma, acho que até a conheço.
E um beijinho para ti, e um beijo na mão da avozinha, como gostava.

Maria disse...

Meu Corvo
Ela tambem teria gostado de te conecer. Iam dar-se bem de certeza.
Beijinho
Mãe

mariabesuga disse...

"A Benção" Maria e aquele abraço muito forte.
Há-de estar feliz lá no seu "cantinho" agora a tua avó...

Beijinho meu para ti

Maria disse...

Girassol querida
O meu irmão diz que ontem deviam estar todos em volta de uma nuvem, a festejar os anos da Avó e tentando ver-nos cá em baixo.
Um dia, quem sabe se não estarei com eles todos?
Aquele abraço que já me falta.
Maria

Laura disse...

Maria, essa de termos ambas o coração ao pé da boca..e de falarmos quando nem devíamos, ahhh somos sagitarianas e está dito..bota as culpas no signo...

Amanhã todos os que se amaram se juntarão de novo e todos juntos festejaremos o Amor na sua real verdade...

Espreita a minha obra de arte acabadinha de pintar...
Um jinho repenicadinho na tua carinha..laura

Zé do Cão disse...

Maria
Os meus "putos" nunca mais me dão um neto. Tenho de ir à bruxa.

E o mais novo, com a embalagem já vai na sexta mulher. Veio de férias da Filandia e já trazia outra, desta vez uma natural da Letónia.
É pior do que os marujos.
Avó é coisa para não se esquecer mais.
Reveste-te nela, não é?
jinhos

Maria disse...

É verdade Zé. Revejo-me muito na minha Avó e nas minhas Mãe e Sogra, como avó. Os brazileiros dizem uma frase que acho linda: "Avó é mãe com açucar".
Que pena não teres netos! Davas um bom Avô. Pode ser que ainda apareça um ou mais.
Beijinhos
Maria

Maria disse...

Laurinha
Vou agora ver.
Beijo
Maria

Maria Soledade disse...

Maria,muito obrigada por teres oferecido este texto.Eu, tal com tu,até uma ccerta idade,também acreditava que a minha Avózinha nunca me iría deixar.Tudo começou quando o meu Pai me/nos deixou era eu aínda uma menina.Lembro-me muito bem de ela me dar colo e dizer-me que nunca me faltaria miminho...Ela falava de miminho porque o meu Pai era o que dizia à noite:Agora é a hora do miminho...E sim,sempre fui muito mimada por essa querida, que era a minha Avózinha.Já fiz não sei quantos poemas para ela e aínda não publiquei nenhum.Porquê?Porque não quero magoar a Minha Mãe que eu Adoro, mas que reconheço que nunca foi meiga como a minha Juá para mim e as minhas poesias não escondem isso.Talvez um dia...

Para a tua Avózinha, para a minha Avózinha,para todas as Avózinhas vai o meu enorme MUUUUUUUUUAAAAAAAAHHHHHHHHHHH******

Maria disse...

Sol querida
As avozinhas são o mel da nossa vida. Sem responsabilidades de educação, podem estragar os netos à vontade. Sei-o por experiência. Sou muito mais tolerante com os netos do que fui com os filhos. A eles não deixava pôr pé em ramo verde, os netos dão-me a volta.
A minha Mãe era doce e meiga, mas quando era preciso, lá vinha o tabefe ou o ralhete. A Avó nunca me bateu. Sabia levar-me como ninguém. Tinha uns olhos verdes, penetrantes, que me viam até ao fundo da alma. Nunca fui capaz de lhe mentir, nem esconder nada. Era a minha confidente. A minha Mãe sentia um bocadinho de ciúme. Sem razão porque eu amava-a e quase endoideci quando morreu. Nunca mais fui a mesma. Dois anos depois foi a Avó que partiu. Há quase 9 anos foi a maior dor da minha vida. A morte do meu grande mestre, do meu ídolo, do meu Pai, que foi a minha grande paixão, antes de conhecer o meu João e ter filhos e netos.
E cá estamos nós, sentimentais e tontas, a falar de desgraças, como sempre.
Um abraço minha querida.
Maria

Andre Moa disse...

A tua avó nunca morre
porque tem uma netinha
que hora a hora a desperta
e a chama: avozinha...!

Beijinhos, minha ternurenta amiga!
André Moa

Maria disse...

Querido André

A neta é agora avó.
E só gostava que um dia
Quando ela já fôr só pó
Se lembrem da avó Maria.

Beijinho da saudosista empedernida
Maria

SEVE disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Maria disse...

Seve amigo
Por experiência posso afirmar que tem razão. Não é que se ame mais, mas há mais doçura, mais paciência. O amor é o mesmo.
Obrigada pela visita.
Maria

Laura disse...

Maria; o pai dizia que é um amor ainda maior que pelos filhos, pois tem de ser medido a dobrar, logo...
Beijinho da laura