segunda-feira, 18 de julho de 2011

A minha Pátria é a língua portuguesa


“Não chóro por nada que a vida traga ou leve. Há porém paginas de prosa me teem feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noute em que, ainda creança, li pela primeira vez numa selecta, o passo celebre de Vieira sobre o Rei Salomão, "Fabricou Salomão um palacio..." E fui lendo, até ao fim, tremulo, confuso; depois rompi em lagrimas felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquelle movimento hieratico da nossa clara lingua majestosa, aquelle exprimir das idéas nas palavras inevitaveis, correr de agua porque ha declive, aquelle assombro vocalico em que os sons são cores ideaes - tudo isso me toldou de instincto como uma grande emoção politica. E, disse, chorei; hoje ia relembrando, ainda chóro. Não é - não - a saudade da infancia, de que não tenho saudades: é a saudade da emoção d'aquelle momento a magua de não poder já ler pela primeira vez aquella grande certeza symphonica.
Não tenho sentimento nenhum politico ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriotico.- a minha patria é a lingua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incommodassem pessoalmente, Mas odeio, com odio verdadeiro, com o unico odio minhaque sinto, não quem escreve mal portuguez, não quem nãosabe syntaxe, não quem escreve em orthographia simplificada, mas a pagina mal escripta, como pessoa própria, a syntaxe errada, como gente em que se bata, a orthographia sem ípsilon, como escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.
Sim, porque a orthographia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-m'a do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha.”
(Transcrito da Wikipédia )

Fernando Pessoa

Isto disse Fernando Pessoa. Eu concordo.
Que diria o poeta agora, vendo a língua portuguesa tratada da maneira que é? Talvez o estudioso do ocultismo, tivesse a premonição de que Pátria ia ficar no estado da língua. Isto é: Um verdadeiro caos.
Mantive de propósito a escrita de Pessoa, sem correcção.
Até um dia destes.
Maria

11 comentários:

Vasco disse...

Até ao momento, nem no emprego, nem na faculdade me foi exigida a escrita mediante o novo (des) acordo ortográfico. Continuo e continuarei a escrever tal como aprendi. E quanto mais antigas são as publicações mais sentido se verifica na "Syntaxe". Este Y, por exemplo, é diferente do I. De facto este C antes do T serve para alguma coisa. E os Egípcios vão passar a chamar-se Egítios ou o quê?

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Olá, querida Maria.
Nessa questão, língua portuguesa, fico, no dizer dos antigos "entre a cuz e a espada". Acredito mesmo que, se a língua portuguesa não tivesse vindo para o Brasil, por força da colonização, possivelmente ela teria "escapado" ao "caos" de que você fala.
Somos um país quase continente.
Há quem diga que a língua é dinâmica e que, a gramática nasceu depois da língua,daí as mudanças.

Leio textos antigos, como o de Fernando Pessoa, leio tantos mais, e gosto. Leio os escritos hoje, quando bem escritos, e gosto.
As mudanças, quando ocorrem, são a partir de anos de discussões, até se chegar a um acordo. Fazem parte,do "grupo das mudanças", nomes de alto nível, "entendidos",
na língua potuguesa. Depois de aprovado, o tal acordo, não há como se fugir dele: não há como não aceitar...na prática.
No entanto, temos todo o direito, e liberdade,,de sermos contra e protestar.
Estou de acordo com você, Maria, mas tenho que "entrar no esquema",
senão, não sobrevivo no meio literário.

A minha pátria, então, seria "a língua brasileira", na visão de muitos portugueses. A realidade é essa....sem tirar, nem por..(risos).

Beijinho, querida amiga.

Unknown disse...

Mariamiga

Não posso estar mais de acordo com o acordo e, obviamente, com o nossa Lúciamiga.

A língua é, realmente, um organismo vivo. A sua evolução é perfeitamente perceptível e se não a aceitarmos corremos o risco de ela passar a ser um organismo - morto.

Mas também penso que há muita gente que a continuará a escrever como a aprendeu. O nosso Pessoa escrevia aquelle, ideaes, instincto, symphonica, incommodassem, portuguez, syntaxe, orthographia e ninguém morreu quando aquele instinto vcom os seus ideais, se transformou numa sinfónica harmonia que não incomodou um português, seguindo a sintaxe e a ortografia hoje em uso.

Amanhã se verá.

Qjs

Maria disse...

Corvo
Não digas "desta água não beberei".
Mais dia, menos dia, terás de te habituar, gostes ou não. Alguém com o teu trabalho, não pode dar "erros".
Eu posso e vou, continuar a escrever como aprendi.
O mais grave é não entender, porquê toda esta mudança. Sinto que estou a ser colonizada e, não gosto.
Beijinho
Mãe

Maria disse...

Lucinha e Henriquamigo
Vai para os dois, porque a resposta é igual.
É claro que, não daria jeito nenhum, estar a escrever como antigamente.
A língua evolui, como a escrita também. Já não é a primeira vez que a linguagem escrita é revista. A falada tem sido alvo de um ataque cerrado, com a influência do inglês, das línguas africanas, da brasileira e, até da linguagem informática e SMS do telemóvel.
Tudo isto faz uma língua caótica que eu não consigo aceitar.
Dentro de Portugal há várias maneiras de falar, pronúncias diferentes mas, a escrita era igual em todo o país.
É isso que me irrita. Esta perda de nacionalidade que vai acontecendo desde a política à língua. Desde a música aos usos e culinária. Vivemos, pensamos, escrevemos, comemos tudo, desde que não seja nosso.
Sinto-me estranha no meu país. Isso entristece-me.
Lucinha
Um beijo
Maria
Henriquamigo
Abraço do João, beijinhos para a Raquel e, queijinhos para tu
Maria

Kim disse...

Aceito perfeitamente todas as alterações que se possam fazer numa lingua pátria, mas parece-me que este acordo ortográfico é uma amálgama de coisas por explicar. Umas palavras podem escrever-se das duas maneira, outras já não e muitas outras alterações muito mal explicadas.
Esta alteração não tem nada a ver com as anteriormente ocorridas.
Beijinhos ma Petite Marie

Alva disse...

Olá Maria,

Como não quero repetir o que já foi dito, faço minhas as palavras do Kim!

Muitos beijinhos,
Estrela d'Alva

Maria disse...

Kim amigo
É isso mesmo que me baralha. Claro que tudo muda mas, em termos.
Isto que temos agora, é uma baralhada que ninguém entende, tal como não entende, o "Estado a que nós chegámos".
Vivemos em barafunda que temos.
Beijo.
Maria

Maria disse...

Pequenina
Vê a resposta que dei ao Kim.
Nas escolas deve ser uma confusão.
Beijinhos, linda.
Maria

Je Vois La Vie en Vert disse...

Tendo estudo grego e latim, gosto da língua na sua forma original porque entendo o porquê de certa ortografia.

Em francês, há palavras bem complicadas, principalmente quando têm 2 consoantes repetidas sem razão aparente. Já fizeram algumas mudanças na língua francesa mas como são muito conservador, não abusaram. Mas a juventude actual escreve com tantos erros que até me assusta !
Em resposta ao teu comentário no meu blog : Sabes, eu também nunca senti ódio e espero nunca sentir, prefiro de longe o amor. Aliás, acho que o ódio torna um rosto feio e não quero ser feia...;) LOL
Espero que te sintas um pouco melhor.
Beijinhos, querida amiga

Maria disse...

Querida Verdinha
Acho que ainda não dou muitos erros em francês. Já em português, não juro hoje que, não dê algum erro.
Fiz o curso completo do Instituto de Francês há quase 50 anos. Consigo ler, traduzir, perceber os filmes franceses sem recorrer às legendas, apenas tenho alguma dificuldade a falar mas, desenrasco-me. Estou bem pior com a minha língua, não sei se escrevo bem, por vezes nem entendo o que dizem.
De resto, vamos andando. Gostei das fotos do nosso Moa e, de saber que está a comer bem. A Teresinha está um pouco abatida.
Abraço grande, amiga.
Maria