No dia do teu aniversário, com toda a saudade e carinho, a nossa "Carmen"
Até um dia destes
Maria
domingo, 23 de dezembro de 2012
sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
Papoilas
Um campo de papoilas sob o brilho,
Da luz dum sol de Primavera,
Lembrava colchas de retalhos muito antigas.
Cada folha cosida a outra folha,
Com ponto pequenino, feito à mão,
Parecia um pequeno coração
Ligado a outros, a muitos mais de mil.
Eram as colchas ricas de noivado,
Tecidas de ternura e ilusão,
Quase mantos de sedas e de brocados.
Agora, o tempo é escuro. Só lembram sangue,
O sangue, que cobre a terra de amargura
E deixa sobre ela, tanto corpo exangue.
Já ninguém faz as colchas de noivado.
Os corações, não batem já de amor.
As bombas caem, não há campo em flor,
Restam só corpos mortos, chacinados.
E é assim, que eu vou entristecendo,
Já não há alegria, nem beleza
Nos campos de papoilas sobre o mundo.
Já não consigo ver as colchas de noivado.
Só dor e um desespero, bem profundo.
Hoje estou como o tempo
sábado, 8 de dezembro de 2012
A minha tábua de engomar
Ia fazer seis anos. Queria um ferro e uma tábua de passar,
iguais aos da mãe.O ferro, em tudo igual ao da mãe, menos no tamanho, estava
guardado desde a feira de Santa Iria, sem eu saber. Faltava a tábua. Comprá-la
era díficil. As poucas que havia, eram caras demais, para a magra bolsa do meu
pai. Ele resolveu fazê-la. Com muito trabalho, alguma arte e muito amor, fez a
pequena tábua. Era de noite, quando eu dormia, que ele metia mãos ao
trabalho.Quando acordei no dia dos meus anos, aos pés da cama, estava a tábua
de engomar, forrada a flanela às florinhas azuis e o ferro, com algumas brazas
dentro.Passei lenços, panos da loiça, guardanapos...Da tábua resta apenas a
doce recordação. O ferro está aqui acima. Guardei-o todos estes anos.
Até um dia destes
Maria
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Basílica da Estrela, Zimbório e... Rock’n’roll
Em Julho de 1956 eu estava, como sempre, em
Lisboa. À tristeza de saber que não voltaria mais a Tomar, contrapunha-se o
prazer de nesse ano ter cá o meu irmão. Pela mão dele conheci a Lisboa dos
Monumentos, dos Miradouros, dos Bairros Populares, dos jardins.
Uma manhã fomos à Basílica da Estrela.
Passámos pelo bonito jardim, atravessámos, e no adro da Igreja estava um grupo
de miúdos de alpergatas ( nesse tempo não havia ténis Nike), calças americanas
(também não havia jeans Levis), um rádio de pilhas de onde saía o barulho de
uma música estranha e um senhor aos gritos. Os rapazinhos torciam-se,
atiravam-se ao chão, davam gritos, como se estivessem a ter algum ataque
estranho. A provinciana pata brava, que vivia em mim, ficou pasmada com aquilo.
Logo o mano mais velho e citadino, se apressou a explicar que era um estilo de
música e dança vindas da América. Fiquei mais calma e elucidada, embora um
pouco espantada. É que em Tomar tirando os fados, a música popular, os tangos e
as valsas, aquela música ainda não era conhecida.
Entrámos na Basílica e fiquei deslumbrada. Já
por fora a achara linda, equilibrada, com uma torre de cada lado e aquela
cúpula enorme lá em cima. Dentro rendi-me à beleza dela. Foi-me explicado que
D. Maria I, a mandara erigir como promessa pelo nascimento de um filho. Os
arquitectos e pintores, alguns tinham trabalhado em Mafra. A harmonia e
delicadeza das colunas é maravilhosa. A primeira pedra foi lançada em 1776 e a
Basílica foi inaugurada em 1789. É de estilo Neoclássico, com três naves. Na do
centro destaca-se o túmulo da sua Fundadora. Morta no Brasil, foi o seu corpo
trazido para Portugal e ali repousa.
A parte mais aventurosa da visita foi a
subida ao Zimbório, que pouco depois foi encerrado ao público. Subimos a escada
e no alto eu tive Lisboa aos pés. E Lisboa é tão linda! Os telhados, as
trapeiras com sardinheiras, as torres de outras Igrejas, o verde dos jardins,
tudo me parecia novo e diferente. O céu azul estava tão perto, que por
instantes, julguei lá chegar. O Tejo brilhava ao fundo, sulcado de Cacilheiros
e outros barcos, os sons chegavam lá acima esbatidos. Com os olhos cheios de
luz, desta luz de Lisboa que não é igual a mais nenhuma, desci com pena.
Foi assim, meu irmão, pela tua mão, pela tua
voz, com o teu carinho, que passei amar Lisboa de outra maneira mais profunda,
mais íntima.
Até um dia destes.
Maria
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
Férias, uma garrafa de porto, 3 cálices e muita juventude
Há cerca de 52
anos, passei um mês de férias com um casal amigo dos meus pais, numa pequena
aldeia, chamada São Bartolomeu do Mar, a uns quilómetros de Esposende. Lá
conheci, uma prima da amiga com quem fora, uns anos mais velha do que eu,
casada e com uma filha pequenina. Tornámo-nos muito amigas. Eles tinham alugado
uma barraca de pescadores, que ficava numa ponta do vasto areal. De manhã íamos
à praia, mas à tarde, geralmente a ventania era tanta, que não saíamos de casa.
A menina dormia a sesta e nós abancávamos à mesa, perto da janela, com a
garrafa, os cálices, bolacha Maria, às vezes os dados e conversa para a tarde
toda. Todos gostávamos de falar e contar histórias. Ele, mais velho do que a
mulher, sobrinho de um conhecido escritor, inteligente, professor de
surdos-mudos, tinha uma enorme cultura e grande conhecimento do Porto de outras
eras; Ela, pertencia a uma das boas famílias do Porto. Tiveram um romance
atribulado, tinham uma vida apertada, mas eram felizes. Discutíamos História,
Literatura, até política. O nível da garrafa descia e, para falar verdade o da
conversa também. Vinham as anedotas, a má língua, as aventuras e desventuras
dos conhecidos. No dia seguinte, um de nós ia à ti’ Albina, misto de tasca,
mercearia, retrosaria, talho, buscar outra garrafa, a mais barata claro, e as
bolachas.
Às vezes à
noite, esvaziado o estábulo das vacas da ti’Albina, ligado o gerador, ligada a
televisão, quem queria ver o programa, levava a cadeira ou o banco de casa,
pagava 1$00 e via, mais ou menos às riscas, “A Dama das Camélias”, “As duas
Órfãs”, “Os três Mosqueteiros”, com direito a leitura das legendas em voz alta
e ao agradável e saudável, cheiro a estrume de vaca.
Porque me veio tudo isto hoje à memória? Porque bebi um cálice de Porto à saúde de um familiar que faz anos.
Porque me veio tudo isto hoje à memória? Porque bebi um cálice de Porto à saúde de um familiar que faz anos.
Mais uma vez,
a saudade bateu à porta da minha alma. A maioria dos meus companheiros dessas
férias, ou morreram, ou nada sei deles.
Dos meus dois
companheiros dessas tardes, sei que ele morreu. Dela e da filha nada sei e
tenho pena.
Comecei a
brincar, acabo triste. Saudades Tony, onde estiveres. Saudades Lai. Por onde
andas?
E São
”Bartolonosso”, ainda terá o “banho santo”, no fim de Agosto?
Ai meus 15,
aonde vocês vão!
Até um dia
destes.
Maria
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
Lírio branco
Se te lembro
eu vejo um lírio branco.
Era alva a
tua pele, a tua alma
Davas a
sensação de meiga calma
Com um olhar
sereno e um sorriso franco.
Havia nos
teus gestos a doçura
Que as
abelhas dão ao doce mel.
Eras meu
branco lírio de Israel
A imagem do
amor e da ternura.
Tudo em ti
era belo e era puro
Tinhas no
sorriso sempre aberto
A lealdade do
crente bem seguro.
A fé, a
esperança, a santa caridade.
Contigo era
sempre tudo certo.
E o que
sentias era só verdade.
Maria
Até um dia destes.
Maria
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
A Amante
Quadro de Paula Rego
Impõe-se uma breve explicação. Isto passou-se
há mais de quarenta anos, num tempo em que às mulheres eram negados todos os
direitos. Uma menina que tivesse tido relações sexuais com um homem, tinha
várias soluções. Se era rica, ia a um médico especialista que por artes mágicas
lhe restituía a perdida virgindade. Se tinha menos dinheiro ia a um médico,
geralmente amigo da família, que lhe passava um atestado em que assegurava que
a menina tinha tido o azar de cair em cima duma pedra, andara demais a cavalo,
qualquer coisa que desse ao futuro esposo a certeza de a ter em primeira mão.
Quando era uma pobre moça sem posses, sem conhecimentos, o remédio era ficar
solteira e para tia, ou passar de mão em mão. Qualquer rapariga que passasse
por isto, dizia-se “enganada”. Quando a menina era menor e as coisas chegavam a
tribunal, o custo da pureza dela eram quarenta contos, que o senhor que a tinha
“enganado” pagava. Se não acreditam, perguntem.
Conheci uma e aqui começa a história, que ma
contou assim:
“Tinha dezassete anos quando o conheci.
Dizia-se viúvo, com um filho. Dava-me muitas prendas. Arranjou emprego aos meus
irmãos.
Dizia que íamos casar a Fátima e que eu teria
um belo vestido branco e flores de laranjeira. Eu acreditei nele. Acreditei
tanto, que a flor de laranjeira teria sido uma mentira.
Um dia, a minha irmã descobriu que ele era
casado. Eu chorei, ameacei que o deixava. Mandou-me calar e contou tudo à minha
mãe. Eu gostava dele e não via maneira de o deixar.
Pôs-me casa, deu-me roupas, jóias,
visitava-me todos os dias, mas à noite voltava para casa, para a mulher. Era o
que me custava mais. Noites e noites sozinha, numa casa bonita, mas vazia.
As pessoas falam de mim, eu sei, ouço-as: lá
vai ela, a amante do empreiteiro. Estas é que a levam direita. Coitada da
mulher... Eu também tenho pena dela, mas pelo menos à noite, no Natal nos dias
de festa é com ela que está, eu estou sozinha.
Engravidei. Fiquei contente. Não voltaria a
estar só. Disse-lhe e ele secamente, mandou-me preparar para ir no outro dia à
parteira. Chorei, pedi, insultei. A resposta foi uma carga de porrada tão
grande, que já não tive de ir à parteira. Continuei com ele e com a mágoa de
nem um filho poder ter. A outra tem três. Tenho tudo, dizem elas. E as noites
de solidão? E a casa sem um riso de criança? E os meus dias vazios? Tenho tudo.
Sabe? Ele casou com ela em Fátima. Ela foi de
branco e flor de laranjeira. Ele mostrou-me as fotografias.
Pois. Eu sou a outra, aquela que só tem a
parte boa de um homem.
Mas não me importava de trocar a casa, os
vestidos, as jóias, por um homem só meu, a quem lavasse a roupa e cosesse as
meias, um filho, companhia à noite. Mesmo que fosse numa barraca.”
Quem me contou isto já morreu. Fui amiga dela
muitos anos e sei a grande mulher que era.
Felizmente que tudo hoje é diferente. As
mulheres são livres e conquistaram direitos. Hoje é normal as mães avisarem as
filhas dos perigos que correm, aconselharem a pílula ou outro contraceptivo.
Naquele tempo a palavra de ordem era: Defender a virgindade de todas as formas.
Que estupidez, que hipocrisia, que coisa tão incrível, não mocinhas? Mas era
assim.
Até um dia destes
Maria
sábado, 20 de outubro de 2012
Santa Iria, a história e a lenda
Qualquer Tomarense saberá que, hoje é “Dia de Santa Iria”.
Também a maior parte, saberá
mais ou menos a lenda.
Primeiro, contarei a
história, aquilo que, segundo os muitos livros, se sabe de verdade à cerca da
Santa da nossa terra.
Iria, ou Irene, era natural
de Sellium, filha de Hermenegildo e Eugénia, ricos proprietários. Foi entregue
a duas tias, Casta e Júlia, monjas professas do Convento de Santa Clara, hoje
chamado de Santa Iria.
Querendo que, a menina
tivesse uma educação mais vasta, foi pedido a Célio, seu tio e Dom Abade, do
Convento de Frades, então existente, que lhe arranjasse um preceptor, entre os
seus frades.
O escolhido, Remígio, era
culto, bom cristão, mas apaixonou-se por Iria, sendo por ela repelido. Não era
o primeiro a amar Iria. Britaldo, moço rico, de boas famílias, já a amava
também, ao ponto de adoecer de amor. Os pais rogaram a Iria que, lhes salvasse
o filho. Ela, visitou-o, mas disse-lhe que, nunca poderia ser dele, porque já
se tinha dado a Cristo e, seria monja. Britaldo, conformou-se, depois de Iria
lhe prometer que, não seria de mais ninguém. Remígio, porém, não se conformou.
Deu uma qualquer beberagem a Iria que, ao fim de pouco tempo, provocou na donzela, todas as aparências, de uma
gravidez.
Britaldo, sentindo-se
traído, procurou a pobre menina, degolou-a e lançou-a ao Nabão. A Imagem, ainda
existente, mostra o sítio do crime. O corpo, seguiu o curso do rio e, foi parar
a Santarém. (Santa Iria, Santa Irene, Santarém) O dia do martírio de Iria,
seria 20 de Outubro do ano 635 da era de Cristo.
Até aqui, é a história, mais
ou menos conhecida de Santa Iria.
O resto é lenda, ou melhor,
são lendas. Na busca que fiz, em muitos e variados livros, há lendas de Santa
Iria, desde o Ribatejo ao Minho, desde as Beiras ao Algarve, desde os Açores à
Galiza e ao Brasil. Diferem umas das
outras, em pequenos pormenores, mas o certo é, que Iria foi degolada. Escolhi,
a mais parecida com a que minha Mãe, me lia em pequenina. Vem no “Romanceiro”
de Teófilo Braga.
Santa Iria
Estando eu a coser
Na minha almofada,
Minha agulha de ouro,
Meu dedal de prata,
Passou um cavaleiro,
Pediu-me pousada.
Se meu pai lh’a desse,
Estava mui bem dada;
Deu lh’a minha mãe
Por ser confiada.
Subiu para cima,
Elle se assentou;
Puz-lhe a meza,
Elle ceou;
Fiz-lhe a cama,
Elle se deitou.
Era meia noite dada,
Elle em mim pegou,
Levou-me p’r o monte,
Lá me perguntou
Como me chamava?
Em cas’ de meu pai
Iria a fidalga;
No meio destes montes
Iria coitada.
Por esta palavra
Serás degolada.
Puchou do alfauge
E a degollou;
Coberta de rosas
Alli a deixou.
D’alli a sete annos
Por alli passou:
Pastorinhos novos,
Que guardaes o gado
Que Santa é aquella.
Que está n’aquelle adro?
«É a Santa Iria;
Morreu degollada!
Oh Santa Iria,
Meu amor primeiro,
Perdôa-me a morte,
Serei teu romeiro.
«Não perdôo, não,
Vilão carniceiro,
Da minha garganta
Fizeste carneiro:
Do meu cabellinho
Fizeste dinheiro.
Veste-te de azul
E mais de amarello;
Se Deus te perdoar.
Perdoar-te quero.
Está escrito, tal qual o
copiei. Respeitei o texto e a grafia.
E aqui está, a lenda e a
história da nossa Santa
Faz hoje 11 anos, meu Pai
partiu. No dia da Padroeira da terra que ele tanto amou. Já não viu a ruína em
que transformou o Convento da Santinha.
Tenho saudades do tempo, em
que junto a ele, meu Pai me contou a história.
Tenho saudades dele. Tenho
saudades da Tomar da minha infância.
Até um dia destes
Maria
terça-feira, 16 de outubro de 2012
Um ano de Saudade
Foto do nosso Kim
Faz hoje um ano que partiste, meu amigo.
Outros falarão de ti.
Eu limito-me a olhar esta foto e a lembrar a amizade que ela
mostra.
Abreijos, André. Saudades.
Maria
domingo, 14 de outubro de 2012
Yves Montand
Fazia ontem, 13 de Outubro, 91 anos, Yves Montand, actor,
cantor, “Partisan”.
Para ele, para todos os que ainda o lembram, “Chanson des
Partisans”.
Até um dia destes
Maria
sábado, 6 de outubro de 2012
Lembras-te ainda?
Era nas noites ventosas de Junho em Cascais, há tantos anos!
Eu tinha frio (fingia que o sentia?) e os teus braços
envolviam-me num abraço doce e quente. Andávamos pelas ruas quase desertas e
mal iluminadas, acertando o passo um pelo outro, como se estivéssemos a treinar-nos para a longa caminhada da nossa
vida.
Por vezes, um candeeiro apagava. Lembras-te? Era quando nos
beijávamos. Parecia que os candeeiros nos queriam esconder de olhos estranhos.
Havia muito vento. O meu cabelo longo, batia nos nossos rostos unidos, fazendo
de cortina. Ninguém via? Nessa altura não nos preocupávamos com isso.
Sentíamos-nos os únicos à face da
terra. O mar, as estrelas, a praia, o mundo, eram só nossos.
As horas passavam. Chegava ao fim o sonho. Tínhamos de nos
separar. Levavas-me a casa. Não, não havia beijos à despedida. A minha tia
espreitava entre as cortinas. Uma carícia nos cabelos, uma troca de olhares,
duas mãos que levavam tempo a soltar-se e... Até amanhã, meu Amor.
Lembras-te ainda?
Até um dia destes.
Maria
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
Tenho Saudades, Pai
O tempo passa e a Saudade aumenta
Fazes-me falta Pai, fazes-me falta.
Falo contigo, chamo-te em voz alta
Nada adormece a dor que me atormenta.
Quero lembrar momentos de alegria
Doces tempos de infância e felicidade
E apenas acordo mais esta Saudade
Apenas acordo mais dor e Nostalgia.
E já não sei chorar, só sei sofrer.
Leio as tuas cartas não te ouço,
Olho os teus retratos não te vejo.
O tempo que me resta para viver
Será de luto, pois nem mesmo posso
No dia dos teus anos dar-te um beijo.
Até um dia destes
Maria
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
Mãos Vazias

Levei a vida inteira a tudo dar.
Amor, ternura, sem troca nem razão.
Sofri tudo, sem muito me queixar
Amei o mundo, a todos dei a mão.
Agora, a saudade, a solidão
São a minha grande companhia,
Aqueles a quem dei a minha mão,
Nada põem na minha mão vazia.
Nem um carinho, nem uma lembrança
Eu sinto já, da parte de alguém
Nem sequer um riso de criança
Eu ouço nesta terra de ninguém.
E olho então as minhas mãos vazias,
Roço-as uma na outra para sentir
Algum calor nas tristes mãos tão frias
Que não têm outras mãos para as cobrir.
Maria
Até um dia destes
Maria
sábado, 15 de setembro de 2012
Era uma vez... em 1800
A história começa em 18... e vem até aos dias de hoje. Vou resumir por várias razões:
1ª Não sou o Camilo Castelo Branco.
2ª Era uma grande estopada.
3ª Ou eu ficava maluca ou alguém ficava, tal é o emaranhado da história toda.
Em 18... vieram de Colares dois irmãos em busca de uma melhor vida. Um emigrou para o Brasil à procura da árvore das patacas. O outro ficou em Lisboa e encontrou a dita árvore. Casou com uma menina filha de um agiota, herdou o negócio e fê-lo prosperar. Camilo fala dele num dos seus livros. Foi ele quem liquidou a herança do pai do escritor. Tiveram duas filhas, belas moças. Chamavam-se respectivamente: Bonifácia Dinis e Adelaide Olímpia. Só ponho os nomes para que a história fique clara.
Um belo dia chegou do Brasil o tio emigrado. Vinha rico e solteiro. Os dois irmãos logo resolveram juntar as duas fortunas. Foi dito à pobre da Bonifácia que iria ser esposa amantíssima do tio. Claro que a menina nem teve tempo para pensar, quanto mais para dar a sua opinião. Casou, teve três meninos e morreu. Entretanto o agiota tinha morrido e a Adelaide foi morar com a mana e o tio-cunhado-tutor. Ela criava e tomava conta dos sobrinhos, ele tomou conta dela. Tomou tão bem, que ao fim de uns meses nasceu uma menina. A pobre Adelaide viu-se com uma filha, bastante dinheiro e uma quinta no termo do Lumiar. Já doente, por lá foi ficando com a filha e duas velhas criadas. Os sobrinhos visitavam-na, ajudando-a a suportar a solidão, o abandono do tio-cunhado-tutor-amante, que entretanto já casara de novo e tinha outra filha. Ela morreu, a menina foi entregue à irmã mais velha.
Pensam que acabou? Não. Agora é que vem o melhor.
Há tempos, o meu Filho comprou uma casa. Sabem aonde? Precisamente no sítio onde a minha bisavó escondeu a sua vergonha e mágoa de abandonada. Como sei? Possuo ainda a escritura dessa quinta em nome da minha avó. Mas é só a escritura, a quinta é hoje um aglomerado de casas. Quer dizer: o meu filho comprou uma ínfima parte, daquilo que um dia foi da minha família.
E diz a outra que não há coincidências!
Estão a ver que eu não sou o Camilo? Se fosse, esta história teria dois volumes, pelo menos.
Até um dia destes
Maria
domingo, 9 de setembro de 2012
Resto
Paula Rego
Sou resto de trapo
De um vestido velho
Deitado no lixo.
Sou caco de espelho
Que reflecte a luz
Duma forma estranha.
Sou resto de nada
Pois nada vivi
Sou resto que resta
Da vida que teima
Em viver em mim.
Maria
Até um dia destes
Maria
quarta-feira, 5 de setembro de 2012
sexta-feira, 24 de agosto de 2012
"Viejos Tangos de mi flor"

Minha Margarida:
Lembras-te ainda?
Aquele velho quarto do sótão, ouvia-nos cantar, via-nos
chorar, rir, fumar uns cigarritos.
“Volver” eu queria. Sinto “Nostalgia” desse tempo. Era à
“Média luz” e “Fumando espero”, que sonhávamos aquele “Uno”, que nos mostraria
o “Camiñito” da felicidade. Seria alguém que nos diria:” El dia que me quieras”
e, “Mano a mano” seguiríamos, até nos dizerem: “Lo han visto con otra”. Cantaríamos então, entre lágrimas “Esta
noche me emborracho”, sentindo a dor da “Soledad”.
Mas o mundo “Yira Yira”
e, depois de um último “Adios Muchachos”, Mudariamos um momento de
estilo e guardaríamos em “El Relicário” as lágrimas e os suspiros.
Já cá não estás. Como me fazes falta!
Quem atura esta “Milonga” que me ataca?
Até um dia, minha sempre querida.
Beijo
Maria
Até um dia destes
Maria
domingo, 19 de agosto de 2012
Impaciência
Sempre a pressa, a correria,
A vontade de chegar.
Nunca chega onde queria,
Quando chega, quer voltar.
Sonham-se sonhos de fumo,
Sem asas para voar,
Sem nunca encontrar o rumo
Do que se quer alcançar.
Alma errante, fugidia,
Que não para de sonhar,
Se está bem aqui, um dia
No outro, já quer zarpar.
Se está só, quer companhia,
Se a tem, quer ver-se só.
Chora se sente alegria
E ri quando mete dó.
E assim se vai vivendo
A ver o tempo passar.
sempre buscando e não vendo,
Um porto para ancorar.
Maria
Até um dia destes.
Maria
domingo, 12 de agosto de 2012
Carta a meu Avô, “João Semana”
Querido Avô:
Não te conheci, mas sei a tua história.
Chamavas-te António e eras médico. Tinhas um consultório
onde recebias toda a gente. Os que tinham dinheiro pagavam, os outros não.
Contaram-me, que chegavas a dar remédios e dinheiro, aos mais carenciados. Nunca te negaste a visitar um doente, de
dia ou de noite. Eras adorado pelos moradores do bairro onde moravas. Quando
morreste, eles quiseram fazer-te uma estátua. A Avó não quis. Achou que não
gostarias.
Quando te formaste, fizeste o ”Juramento de Hipocrates”, que
cumpriste na totalidade.
Lembrei-me de ti, das histórias que ouvi contar, de médicos
irrepreensíveis que conheci e conheço, porque se passou um caso comigo, que me
deixou espantada, revoltada.
Tu não sabes, mas existe há uns anos, uma coisa chamada
Serviço Nacional de Saúde, que segundo as tuas ideias, serviria para acudir a
todos, sobretudo aos pobres. Todos temos um cartão, que em princípio, nos daria
acesso a tratamento médico, incluindo assistência de médico de família. Há
quatro anos, o meu doutor, reformou-se e, nunca o substituíram. Tenho uma
médica particular óptima, mas não dá jeito nenhum pagar uma consulta, de cada
vez que tenho necessidade de medicamentos. Aqui há um mês, atribuíram-me um médico.
Marquei consulta e lá fui, conhecer o senhor. Logo de entrada assustei-me, com
o aspecto dele. Mal encarado, bruto. Tentei mostrar-lhe as análises feitas dias
antes. Avisou-me que não estava ali para dar consultas, mas sim, para passar
receitas e às vezes análises. Consultas, só no consultório.
Agradeci, disse que já tinha médica particular, passou-me
duas receitas e, saí.
Entendes, Avô? Eu não. Só quem tem alguns tostões pode estar
doente? E os outros? Morrem? Não têm dinheiro para o médico, não podem pagar os
medicamentos, sofrem e morrem.
Que me perdoem os médicos, que felizmente ainda existem, mas alguns doutores, não fizeram o tal juramento. Ou fizeram e esqueceram?
Se foi esse o caso, aqui vai a cópia:
“Eu juro, por Apolo, médico, por Esculápio, Higeia e Panaceia, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas,
cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue: estimar,
tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e,
se necessário for, com ele partilhar meus bens; ter seus filhos por meus
próprios irmãos; ensinar-lhes esta arte, se eles tiverem necessidade de
aprendê-la, sem remuneração e nem compromisso escrito; fazer participar dos
preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu
mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém,
só a estes.
Aplicarei os regimes
para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano
ou mal a alguém. A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um
conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma
substância abortiva.
Conservarei imaculada
minha vida e minha arte.
Não praticarei a
talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos
que disso cuidam.
Em toda a casa, aí
entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e
de toda a sedução sobretudo longe dos prazeres do amor, com as mulheres ou com
os homens livres ou escravizados.
Àquilo que no
exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu
tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei
inteiramente secreto.
Se eu cumprir este
juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha
profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou
infringir, o contrário aconteça.
Minha Doutora, meus Doutores, Avô, perdoem a minha revolta.
Acho que para vós, também deve ser triste. Dantes, a
medicina era um sacerdócio. Hoje, para alguns, é um negócio.
Fico por aqui, Avô. Deves estar espantado. O mundo, as
pessoas, mudaram muito, desde o teu tempo.
Beijinhos à Avó, aos meus Pais e Tios e, para ti, da neta
Maria
Até um dia destes e não adoeçam, se não tiverem dinheiro.
Maria
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
Mágoa
Mágoa!
Mágoa e dor
Com os olhos rasos de água
E o peito cheio de amor.
Finjo!
Finjo tanto,
Que dos meus olhos o pranto
Cai no meu peito que cinjo.
Ardem!
Ardem as gotas de
água
Que no meu rosto não caem
E me causam maior mágoa.
Maria
Até um dia destes.
Maria
terça-feira, 31 de julho de 2012
Perdi os Meus Fantásticos Castelos

Perdi
meus fantásticos castelos
Como
névoa distante que se esfuma...
Quis
vencer, quis lutar, quis defendê-los:
Quebrei
as minhas lanças uma a uma!
Perdi
minhas galeras entre os gelos
Que
se afundaram sobre um mar de bruma...
-
Tantos escolhos! Quem podia vê-los? –
Deitei-me
ao mar e não salvei nenhuma!
Perdi
a minha taça, o meu anel,
A
minha cota de aço, o meu corcel,
Perdi
meu elmo de ouro e pedrarias...
Sobem-me
aos lábios súplicas estranhas...
Sobre
o meu coração pesam montanhas...
Olho
assombrada as minhas mãos vazias...
Florbela
Espanca
Até
um dia destes
Maria
quinta-feira, 26 de julho de 2012
"O Príncipe Perfeito" de Miguel Torga
Porquê de novo o poema de Torga? Porque me apetece. Talvez porque sei que não existem Príncipes Perfeitos. Ninguém é perfeito.
E assim, para que ninguém o esqueça, cá vai de novo "O Príncipe Perfeito" de Miguel Torga.
E assim, para que ninguém o esqueça, cá vai de novo "O Príncipe Perfeito" de Miguel Torga.
Um Príncipe Perfeito em Portugal,
Terra da imperfeição!
Que excessivo perdão
Pode ter quem é rei!
Na bainha do tempo, até o punhal
É uma arma leal!
Assim nela coubesse a alma que sujei…
Perfeito, eu! Perfeito
Um rei que desposava no seu leito
O luto incestuoso da rainha!
Perfeito, eu, que tinha
Um herdeiro da esfera adivinhada,
E o vi morrer, humano,
Com asas de exaurido pelicano,
Às portas da aventura começada!
Perfeito, eu! Perfeito
Quem viu agonizar dentro do peito
A grandeza da vida e quanto fez por ela!
Incapaz, a cobarde caravela
Que mandei ao seu último destino,
Desatado o nó cego, masculino,
Que no sonho enlaçava
A soberba cintura de Castela,
Que perfeição no mundo me ficava?
Pensei, lutei, matei – fiz quanto pude,
Mas em vão.
A quem Deus não ajude,
Tudo são Índias de desilusão.
Miguel Torga
Um bom fim de semana.
Maria
Posted by Maria in 16:59:07
Comments
quinta-feira, 12 de julho de 2012
Olá Amigos:
Não fugi, não fui presa, não tenho nada com o Relvas, nem
com outras coisas...
Tenho tido ,mais que fazer.
Problemas, (quem os não tem?), obras, ainda posso fazê-las,
limpezas, com ajuda ainda lá vou, apesar dos 67!
Hoje achei, que vocês mereciam uma explicação, para a
ausência da Maria. É só esta: trabalho, velhice, problemas, nada mais.
Vou voltar um dia destes. Entretanto, vou recomeçar a
visitá-los.
Bicho, meu padrinho, por onde andas? Temos que nos ver.
Quim, amigo, onde paras?
Henriquamigo, como estás? Sem a “Travessa”, sinto-me só.
Arriba Hombre! Preciso de ti.
Amigos meus, que me continuam a mandar comentários, mails, etc, obrigada.
A Maria vai voltar. Cuidado!
Até um dia destes.
Beijinhos
Maria
domingo, 24 de junho de 2012
Adeus minha querida Madrinha
Nada que eu não esperasse. Tinhas 99 anos, estavas muito
velhinha e cansada. Chegou o teu dia.
Foste, uma das mulheres mais admiraveis que conheci.
Criaste 4 filhos, um dos quais, com o sindroma de Down.
Conseguiste, que lêsse, escrevêsse, fizesse contas. O nosso Henrique, um
cavalheiro muito educado, ainda vive, apesar da esperança de vida deles ser
curta, chegou aos 61 anos. Está mal, não conhece ninguém, mas teve uma vida
feliz. Tu partiste descansada, sabendo que a irmã, continuará a tratar dele.
Dedicaste a tua vida, a pessoas como ele, primeiro em
África, depois em Cascais.
Em África a vida foi dura, com o meu Padrinho doente, mas tu
eras uma lutadora, uma mãe coragem. Aqui, conseguiste comprar a tua casinha,
trabalhaste até conseguires. Os anos passaram, um AVC diminuiu-te muito e,
foste para casa da filha, a minha querida prima, tão valente, tão sofrida, que
te devolveu todo o amor e carinho, que lhe deste.
Dizer que te amei é pouco. Desde pequenina, tinha por ti uma
admiração sem medida, sentia-me orgulhosa de ser tua sobrinha e afilhada,
adorava quando me achavam parecida contigo.
Esta foto, tirada na última vez que te vi, lembra-me que
falámos, rimos, até cantarolámos as
duas. As nossas mãos estiveram sempre apertadas, as nossas mãos tão parecidas.
Sabes? Foste a irmã querida do meu Pai, eras um pedaço dele,
que ainda vivia.
Não sou capaz de escrever mais.
Vera, Zé Manel, Nica, meu querido Quico, a vossa prima é
muito vossa amiga. Um abraço grande e beijinhos para vós, maridos, mulher e
filhos, da vossa Maga.
Madrinha, adeus. Um último beijo, um último pedido: A tua
benção.
Da tua sobrinha e afilhada que nunca te esquecerá e vai
sempre amar-te.
Maga
Amigos: Até qualquer dia.
Maria
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Dei-te o nome do meu Rio...
Eu dei-te o nome do Rio
Que banha a minha cidade
Dei-te comida, guardei-te do frio
Em troca recebi felicidade.
Dei-te ternura, amor, o meu carinho
Em troca recebi, o dobro do que dei
Catorze anos, Nabão. Ó meu cãozinho!
Eu não te esquecerei.
Não mais o teu calor nos meus joelhos,
Não mais o teu rabito a dar a dar
E esses olhos, meu cão, o teu olhar,
Olhando com amor, os donos velhos.
Quem vai lamber agora as gotas de água,
Que caem dos meus olhos, quem Nabão?
Eu deixei-te partir, não queria, não!
Não sabia o tamanho desta mágoa.
Faz hoje um mês, meu bicho, que partiste. Nessa noite, fiz
isto, para ti.
Fazes tanta falta!
Saudades dos donos.
Até um dia destes.
Maria
terça-feira, 5 de junho de 2012
Para duas pessoas, a quem desejo toda a felicidade
Soneto de Fidelidade
Vinicius de Moraes
De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Para os dois, um dos mais bonitos sonetos de Amor, da língua Portuguesa.
Mil beijinhos.
Maria
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